domingo, 19 de abril de 2009

QUEM LHE(S) DEU AUTORIDADE?


Chegaram novamente a Jerusalém e, quando Jesus estava passando pelo templo, aproximaram-se dele os chefes dos sacerdotes, os mestres da lei e os líderes religiosos e lhe perguntaram: “Com que autoridade estás fazendo estas coisas? Quem te deu autoridade para fazê-las?”

Respondeu Jesus: “Eu lhes farei uma pergunta. Respondam-me, e eu lhes direi com que autoridade estou fazendo estas coisas. O batismo de João era do céu ou dos homens? Digam-me!”

Eles discutiam entre si, dizendo: “Se dissermos: Dos céus, ele perguntará: ‘Então por que vocês não creram nele?’ Mas se dissermos: Dos homens...” Eles temiam o povo, pois todos realmente consideravam João um profeta.

Eles responderam a Jesus: “Não sabemos”.

Disse então Jesus: “Tampouco lhes direi com que autoridade estou fazendo estas coisas”.

“Quem você pensa que é?” é a típica pergunta questionadora acerca do direito ou autoridade de alguém em relação a uma outra pessoa. Talvez, você já fez ou até mesmo foi questionado com esta frase. Questionar a autoridade é algo comum ao longo da história das civilizações. A história está cheia de narrativas de reis que perderam seu governo pela mão de revoltosos.

Recentemente, a imprensa boliviana relatou a prisão de algumas pessoas que supostamente planejavam um atentado contra o presidente Evo Morales. Se esse plano de atentado era real ou criação da presidência boliviana às vésperas da OEA não se sabe, mas certamente há profundos questionamentos a respeito da autoridade e direitos do presidente Evo depois de forçar o congresso a votar a favor da possibilidade de sua reeleição.
Na primeira metade do século passado, Dietrich Bonhoeffer foi um destes a duvidarem da autoridade do líder de seu país. Seu plano era assassinar Hitler e justificava seu intento com a famosa frase: “É melhor fazer um mal do que ser mau”. Por trás dela estava sua compreensão de que a maldade de Hitler tirara seu direito de continuar governando o país e deveria ser morto.

O famoso poema de Gregório de Mattos, da mesma forma, questionava as autoridades brasileiras de sua época:

Quem faz os círios mesquinhos?... Meirinhos.
Quem faz as farinhas tardas?... Guardas.
Quem as tem nos aposentos?... Sargentos.

Os círios lá vem aos centos,
E a terra fica esfaimando,
Porque os vão atravessando
Meirinhos, guardas, sargentos.

E que justiça a resguarda?... Bastarda.
É grátis distribuída?... Vendida.
Que tem, que a todos assusta?... Injusta.

Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça.
Que anda a Justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.


O Evangelho de Marcos, também, nos conta a respeito do questionamento da autoridade de Jesus por aqueles que se achavam investidos de autoridade pela nação judaica. No final da história a autoridade divina de Jesus se mostra inabalável, enquanto a dos sacerdotes, mestres da lei e anciãos é colocada sob judice, carente de qualquer crédito e direito.

Esse incidente parece ocorrer ainda na terça-feira, depois que Pedro percebera a relação da figueira seca com Israel, a caminho para Jerusalém. Ao andar pelo templo, talvez, num momento de intervalo de seus ensinos (ver Mt 21.23; Lc 20.1), Jesus é abordado pela delegação completa dos grupos que formavam o Sinédrio judaico. Percebe-se uma interpelação formal da parte deles, com o intento de reunir provas contra Jesus e realizar seu plano maquiavélico de matá-lo, expresso alguns versículos antes (Mc 11.18; cf. 3.6). Certamente, o que ocorrera no dia anterior os deixara alarmados, vendo Jesus se virar contra o funcionamento religioso da época, ao derrubar as mesas de vendedores e expulsar pessoas envolvidas com o comércio dentro do templo, além da acusação contra os que dirigiam tal parte do sistema religioso judaico de serem ladrões e corruptos (cf. 11.15-17).

Aquela atitude leva os líderes a perguntarem, claramente: “Com que autoridade fazes estas coisas?” ou “Quem te concedeu tal autoridade para fazer estas coisas?”. A atitude de Jesus, sem dúvida, exigia uma pergunta como esta, mas, não se pode negar a intenção condenatória por parte deles. Caso afirmasse vir sua autoridade da parte de Deus, poderiam acusá-lo de blasfêmia, se não, ficaria patente sua falta de qualquer direito para agir daquela forma.

A resposta de Jesus é outro questionamento. Ele não busca evadir-se da pergunta, mas, simplesmente, lança uma outra que, ao respondê-la, os líderes judaicos obteriam a resposta para sua indagação. A fim de saberem a fonte e natureza da autoridade de Jesus para agir e ensinar daquela forma, eles deveriam dizer qual era a fonte de autoridade do ministério de João Batista, divina ou humana.

João Batista havia apontado para aquele que era maior do que ele, cujo batismo não seria apenas simbólico com água, mas com o próprio Espírito de Deus (Mc 1.7-8). Dentro do Evangelho de Marcos fica muito claro que Jesus era aquele a quem João anunciava. Logo após a descrição da mensagem do profeta, o Senhor Jesus aparece e é batizado por ele, quando isso ocorre, ele recebe o Espírito Santo e o Pai confirma sua autoridade celestial, afirmando ser Jesus seu Filho Amado e o Servo que lhe apraz (cf. Mc 1.9-11). No Evangelho de João, fica ainda mais nítido o reconhecimento por parte do Batista de que Jesus era o Filho de Deus que batizaria o povo com o Espírito Santo (Jo 1.29-34).

Diante disso, a negação ou afirmação dos líderes judeus quanto à autoridade celestial de João para pregar o batismo de arrependimento ao povo, implicaria, proporcionalmente, na negação ou afirmação da autoridade de Jesus. Como líderes do povo de Deus que reivindicavam ser, cabia-lhes fazer o julgamento correto sobre a fonte de autoridade do ministério de João e de Jesus.

As autoridades judaicas começam a considerar qual seria a melhor resposta para a pergunta de Jesus. Eles haviam rejeitado o batismo de João como legítimo (cf. Jo 1.19-28) e, provavelmente, foram eles que espalharam o boato de que o Batista estava endemoninhado (Mt 11.18). Assim, caso afirmassem a autoridade dele como provinda de Deus, sua hipocrisia ficaria logo desmascarada por Jesus, questionando o porquê de sua incredulidade.

Por outro lado, se afirmassem claramente o que pensavam, temiam a reação do povo, pois este considerava João como profeta. A menção ao temor que as autoridades tinham do povo, aparece várias vezes nesta parte do evangelho. Na própria passagem sobre a purificação do templo, eles são cautelosos ao lidarem com Jesus e o temiam, não por ele próprio, mas porque “todo o povo se admirava com seu ensino” (v. 18). Mais à frente, quando Jesus termina de contar a parábola sobre os lavradores que matam o filho do dono de uma vinha, novamente, buscam um meio de prender Jesus, mas como “temiam o povo”, não fazem nada com ele (Mc 12.12). O temor que essas autoridades tinham de perder seu prestígio diante da multidão é algo patente.

Eles decidem, então, ficar em cima do muro, preferem dizer que não sabem do que tomar uma posição diante de Jesus e do povo. Ao fugirem da posição incômoda de dar uma resposta apropriada, essa liderança perdia a própria autoridade que recebera e que reivindicava, pois não se posicionaram numa ocasião que exigia deles isso. Não era mais a autoridade de Jesus que estava sob judice, e sim, a dos líderes judeus. Portanto, diante da suposta incapacidade das autoridades em darem um parecer à sua pergunta e, principalmente, pela incredulidade inveterada deles no reconhecimento de que sua missão vinha da parte de Deus, Jesus se nega a responder-lhes. Assim como rejeitaram a autoridade de João o Batista, também rejeitavam a sua, o que ficava cada vez mais claro pelos seus planos de prendê-lo e matá-lo (cf. 3.6; 11.18; 12.12). Por não crerem na revelação clara do poder de Deus por meio de Jesus Cristo, foi-lhes negada uma revelação maior da parte do Filho.

Em várias situações, não somos tão diferentes das autoridades judaicas ao questionarem a autoridade de Jesus. Muitas vezes, colocamos em cheque a supremacia de Jesus, sem refletirmos com profundidade naquilo que fazemos. Quando mantemos certos pecados habituais e não nos preocupamos em sermos purificados e transformados por Ele, desprezamos sua autoridade sobre nossas vidas que são propriedade de Deus (1 Co 6.19-20). Muitas vezes achamos que Jesus não tem o direito ou a autoridade de dizer com quem devemos nos relacionar, que tipo de lugares devemos evitar, quais atitudes precisamos abandonar. Pensamos que somos donos dos nossos narizes e lemos a Bíblia como melhor agrada ao nosso coração.

Quando deixamos de nos envolvermos com o discipulado de pessoas, ignoramos a autoridade suprema de Cristo que nos convoca a fazermos discípulos (Mt 28.18-20). Talvez, duvidemos do poder de Cristo para transformar vidas, ou tememos a homens como fazia a liderança judaica.

O que nos preocupa mais: a glória de Deus ou dos homens? Nossas atitudes são determinadas por aquilo que agrada as pessoas ou que honra ao Senhor? Será que para agradar o chefe estamos dispostos a dar uma risada discreta quando ele comenta sobre o decote da secretária ou de uma companheira de trabalho? Talvez, xingar o juiz quando estivermos com amigos assistindo as partidas finais do Paulistão caia bem no meio do grupo. Quem sabe ajudar um colega no meio da prova mantenha a amizade, ainda que não seja algo muito honesto a se fazer.

Nossa falta de confiança plena no Mestre nos levará a um temor desmedido dos homens. Se deixamos de crer em quem Ele diz ser e na promessa de Sua presença cuidadora e capacitadora conosco, o desejo de reconhecimento por parte das pessoas é que dirigirá a nossa vida. Viveremos em função dos outros, no lugar sermos completamente dependentes de Deus.

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