domingo, 27 de janeiro de 2008


Dispensacionalismo e Aliancismo: impactos hermenêuticos

Introdução

O presente texto visa uma compreensão dos dois modelos hermenêuticos, dispensacionalismo e aliancismo (mais conhecido como "teologia do pacto"), percebendo seus pressupostos e como estes influenciam a interpretação bíblica de cada grupo.

A diferença básica dos dois grupos implica na maneira como enxergam a relação entre Israel e Igreja, vendo-os como uma unidade ou como dois povos distintos dentro do plano redentor divino. Já houve discussões maiores quanto ao conceito salvífico, isto é, quanto às condições da salvação do homem ao longo da revelação bíblica. Hoje, o ponto de discussão se concentra, como já dito anteriormente, na relação Israel-Igreja, na aplicabilidade do Antigo Testamento à vida cristã e no modo de interpretação da profecia bíblica.

O Aliancismo ou Teologia do Pacto

O aliancismo é um sistema hermenêutico que olha para a revelação bíblica entendendo que Deus se relaciona pactualmente com Suas criaturas desde a eternidade. Há, basicamente, três pactos. O primeiro é o "Pacto de Redenção", onde o Pai, na eternidade, propôs ao Filho enviá-lo com o propósito de redimir a humanidade mediante a obra expiatória deste. Dentro deste pacto maior entre o Pai e o Filho se encontram o "Pacto das Obras" que Deus fizera com Adão antes da queda e o "Pacto da Graça" que se deu pós-queda. O Pacto das Obras dizia respeito às condições para que Adão pudesse viver eternamente na presença de Deus, o que dependia de comer ou não da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2.17), ou seja, de obedecer ou não a Deus. Após a queda humana, Deus estabeleceu o Pacto da Graça, onde as condições para o homem ser salvo de sua separação de Deus se encontram na graça divina, com base na obra de Cristo e mediante a fé humana nesta obra do redentor. Isto implica em que para os aliancistas, desde a queda, a salvação do homem se dava por meio da fé na salvação daquele que viria da semente da mulher (Gn 3.15).

Sendo assim, o pacto entre Deus e Abraão (Gn 12, 15, 17 e 22) é a renovação do Pacto da Graça já feito com Adão (Gn 3.15) e encontra seu cumprimento em Jesus (Gl 3.29) com a Nova Aliança, anunciada por Jeremias (Jr 31.27ss; Hb 8). As promessas quanto à terra feitas a Abraão encontram sua realização nas bênçãos da Nova Aliança e no estado final dos crentes (Hb 3.18 – 4.16; 8; 11.10), não havendo uma diferença de pactos mas uma renovada continuidade e o cumprimento da Aliança de Graça. Portanto, não há motivo para diferenciar Israel e Igreja já que ambos são o povo escolhido de Deus que desfrutam da mesma salvação graciosa dada por Cristo e em quem não há mais divisão, mas apenas um só povo (Ef 2.11ss).

Esta visão unificada, então, dá ensejo para o entendimento espiritual das profecias referente à nação de Israel quanto à terra e ao reinado messiânico davídico que encontram seu cumprimento sobre a igreja e em Cristo, que reina assentado à direita de Deus (At 2.25-36; Ef 1.20-23).

A lei mosaica é enxergada como uma administração temporária dentro do Pacto da Graça e que tinha por propósito tipificar o cumprimento maior na Nova Aliança. Israel não continuara em sua terra por não cumprir os termos da Antiga Aliança ou Lei Mosaica que por sua vez era uma republicação do Pacto das Obras, não tendo mais o poder de conceder vida eterna, mas sim, de delimitar as condições de vida ou morte dentro da terra prometida.
Isto posto, a Antiga Aliança não tem valor algum diante da Nova Aliança e todos os aspectos cerimoniais e civis perdem seu valor como norma de vida. Apenas os aspectos morais é que permanecem para os crentes que estão sob a Nova Aliança, pois, tais aspectos não estavam presos à Antiga Aliança, e sim, ao caráter de Deus.

De modo prático, toda a referência a Israel no Antigo Testamento será diretamente aplicado à Igreja, tanto no que diz respeito às qualidades quanto ao cumprimento profético. Por exemplo, uma das revistas de escola dominical da SOCEP, de cunho aliancista, dedica-se a abordar o tema "Igrejas do Novo Testamento" e no primeiro capítulo ao tratar sobre analogias referente à Igreja, diz que nós somos o rebanho de Deus, apoiando-se em Salmos 100.3. O mesmo pode ser dito quanto a visão de um dos ex-professores do presente escritor que afirmara que Isaías 11.6, ao falar do lobo convivendo com o cordeiro, se cumpre na igreja onde pessoas que antes viviam como inimigas, ao se converterem, passam a conviver em paz.

A maneira como enxergam a continuidade da observância do aspecto moral contido no Pentateuco é exemplificada pela própria Confissão de Westminster, que vê o domingo como sábado cristão a ser obrigatoriamente observado pela Igreja, que anteriormente era o último dia da semana e, agora (isto é, a partir da ressurreição de Cristo), tornou-se o domingo.

O Dispensacionalismo

A hermenêutica dispensacionalista entende que dentro da revelação bíblica há várias épocas, cada uma marcada pela maneira distinta de Deus tratar com o homem, não quanto à salvação (pois esta sempre se dá por causa da graça de Deus, com base na obra de Cristo e por meio da fé), mas quanto à regra de vida. Cada uma dessas diversas formas de Deus se relacionar com o homem é chamada dispensação. Geralmente, a dispensação é marcada por um progresso na revelação de Deus ao homem (uma ampliação do que já fora revelado), pela exigência divina a ser administrada pelo homem, o fracasso humano em cumprir tal administração e o juízo de Deus como conseqüência deste fracasso. A atenção, então, se encontra na incapacidade humana de cumprir os requisitos divinos e sua total dependência da graça de Deus. O número de dispensações não encontra concordância dentro do próprio sistema. Devido ao trato diferente Deus-homem em cada época, se crê que o conteúdo da fé é distinto, também, como no caso de Abraão que não foi justificado por crer na obra redentora de Cristo, mas por crer em Deus, ou seja na graciosa promessa que Este havia feito a ele com respeito ao filho que lhe daria (Rm 4.1-22). Não que a base da salvação não fosse Cristo (Rm 3.23-26), mas o conteúdo era diferente da presente dispensação da Igreja (Rm 4.23-25; 3.21-23). Sempre o conteúdo estará relacionado à graça de Deus e à necessidade da fé humana nesta graça. Mas não é, necessariamente, especifico quanto à obra redentora do Salvador que, sem dúvida, é a base.

Tendo isso em mente, fica clara a distinção da maneira de Deus lidar com a humanidade quanto ao modo de vida, como, também, ao conteúdo de salvação. E assim, as promessas de Deus são respeitadas quanto à sua distinção, como também, a diferença no plano de Deus com Israel e com a Igreja (Rm 11.11-32; Gl 6.14-16). A promessa que Deus fizera a Abraão e à sua descendência (Gn 12, 15, 17, 22) e renovara na Nova Aliança (Jr 31.27ss; Ez 36) com respeito à terra prometida, há de ser cumprida literalmente com Israel. As promessas feitas a Davi e, conseqüentemente, a Israel, também terão seu cumprimento literal (2 Sm 7; Dn 7; Mt 24.29-31; Lc 1.30-33; Ap 19 – 20.9). A renovação espiritual prometida pelos profetas sobre Israel (Is 1.24-27; 44.1-5; Jr 31.27ss; Ez 36 – 37; Rm 11.11-32) se realizará com este povo.

Por mais que houvesse confusão no dispensacionalismo clássico, é admitido no dispensacionalismo desenvolvido, conhecido como progressivo, que a igreja desfruta de bênçãos da Nova Aliança (At 2.14-36). E, além disso, a igreja já não é mais vista como um parêntese no plano de Deus para Israel, mas a continuidade da promessa de por meio de Abraão abençoar todas as famílias da terra (Gn 12.3; Gl 3.6-29). Embora a Igreja não seja Israel, o verdadeiro Israel está contido na igreja nesta presente era (Rm 11.1-7; Ef 2.11-18).

Assim como houve um tratamento peculiar com Israel, o mesmo se dá com a Igreja. Esta já não está mais sob a Lei e por isso, não está obrigada a cumprí-la (Rm 6.14, 15; 2 Co 3.1-11). Nem por isso, o Antigo Testamento perde seu valor, mas continua a trazer princípios acerca de Deus e de Sua vontade para a prática da Igreja (Rm 15.3-5; 1 Co 10.1-13; 2 Tm 3.16, 17).

Demonstrando de modo prático e usando os próprios exemplos dados acima acerca do lidar hermenêutico aliancista, um dispensacionalista jamais usaria Salmo 100.3 para aplicá-lo à Igreja, pois, ali se refere especificamente a Israel. Certamente, mostraria que em João 10 a Igreja é comparada a um rebanho do qual Cristo é o Pastor, especialmente pelo verso 16 que indica a inclusão de gentios neste rebanho (cf. Jo 12.20-23, 31-33).

Ainda nos exemplos, Isaías 11.6 seria visto como uma profecia por se cumprir, contemporânea a uma restauração de Israel à sua terra (11.11-12), uma renovação espiritual do mesmo (11.13) e supremacia sobre as outras nações (11.14-16). O quarto mandamento já não é visto como obrigatório, pois, não existe uma ratificação no Novo, ao contrário, a guarda ou não do sábado é algo indiferente (Rm 14.1-6; Cl 2.16-17).

Conclusão
Tendo em vista os apontamentos acima, a proposta deste texto se cumpre ao mostrar as diferenças básicas do modo único e contínuo aliancista de enxergar o plano de Deus em sua relação com o homem e a maneira contínua, mas distinta, deste processo, apresentada pelo dispensacionalismo. Tais visões influenciam radicalmente a interpretação quanto à relação Israel-Igreja, ao cumprimento profético e à aplicabilidade da lei à vida da Igreja, como fora demonstrado e aplicado.

Bibliografia Consultada

ANDRADE, Anísio Renato de. O Dispensacionalismo. Belo Horizonte, MG, 1996. (extraído de www.monergismo.com).
BEZERRIL, Moisés Cavalcante. A dispensação do pacto. João Pessoa, PB: 1996. (extraído de www.monergismo.com).
CLARK, R. Scott. Tesis sobre la Teologia del Pacto. [n.l.]: 2003.
DUNCAN, Ligon. O que é Teologia do Pacto?.(extraído de www.monergismo.com).
KEATHLEY, Hampton. La relación de la Iglesia a Israel. [n.l.]: Fundación de Estudios Bíblicos, 1997 (extraído de www.bible.org).
MATHISON, Keith A. Dispensationalism: rightly dividing the people of God?. New Jersey: P&R Publishing, 1995.
MCGAHEY, John F. Dispensacionalismo: su definición y defensa. 3 ed. Catalunya, ES: Difusora de Literatura Cristiana Fundamentalista, 1996.
MUÑOZ, Miguel. Avances em los estúdios del Dispensacionalismo. Tegucigalpa, 2003 (extraído de www.equipandolideres.com).
SILVA, Marcelo. Teologia Sistemática II. Atibaia, SP: Seminário Bíblico Palavra da Vida, [n.d]. (Apostila preparada para a disciplina de Teologia Sistemática 2).

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

LIBERDADE PESSOAL
J. Hampton Keathley III


Introdução

Nós vivemos numa sociedade que se entrega ao amor próprio e tudo o que se faz é conforme a própria vontade, buscando a própria felicidade, conforto e paz. Esta entrega ao eu, com certeza, é destrutivo para a sociedade, para a família e qualquer relacionamento humano. Tal curso é o produto da influência e ilusão de Satanás, diretamente opostas à direção e determinações das Escrituras para a vida do cristão.

A ordem para o Corpo de Cristo é amar a Deus e ao próximo, a busca pela promoção do reino de Deus, fazendo não a própria vontade, mas recusando o viver egoísta que pode ser livre para viver para Deus e para os outros.

Assim, encontramos no Novo Testamento aquilo que podemos chamar de doutrina da mutualidade. Repetidas vezes no Novo Testamento, vemos diretrizes e afirmações quanto às nossas responsabilidades mútuas. O ponto essencial é que Deus nos chamou com a finalidade de sermos um povo servil, seguindo o exemplo do nosso Senhor, o qual veio não para ser servido, mas para servir e dar a si mesmo como resgate de muitos.

Gálatas 5 é uma das passagens chaves nas Escrituras que se ocupam com a vida cheia do Espírito ou o andar mediante o Espírito Santo, o qual habita em cada crente. Isso é importante para compreender o argumento central de Paulo a respeito da liberdade do crente. Observe o seguinte:

(1) Os gálatas eram prisioneiros do pecado, em sujeição ao seu controle e morte (3.22), e a Lei não fora capaz de libertá-los. A Lei era meramente uma protetora para orientar Israel até Cristo, quando o homem seria livre do pecado e justificado pela fé (3.24).

(2) Antes de Cristo, o homem era como uma criança, debaixo de seu tutor ou guardião, não diferente de um escravo, em sujeição, debaixo do cumprimento da Lei e do Judaísmo (cf. 4.1-3).

(3) Mas com a vinda de Jesus Cristo, eles foram libertados, tornados filhos adotivos com a habitação do Espírito Santo, o qual era a comprovação da filiação.

(4) Todavia, por causa dos mestres falsos e legalistas, alguns estavam tentando voltar às obras da Lei como um sinal de espiritualidade. Eles se tornavam enredados, novamente, como escravos debaixo da Lei (4.8-11).

(5) Assim, observe a declaração e ordem de Paulo em 5.1-12. Aqui, o apóstolo se concentra com a liberdade do crente e nos adverte contra o enredamento com a lei e qualquer sistema humano de obras, pelo qual alguém tentasse ser justificado da penalidade do pecado ou santificado, liberto do poder do pecado. O cristão é alguém justificado, salvo pela fé na Pessoa e Obra de Jesus Cristo. Ele é, também, uma pessoa santificada, transformada espiritualmente, pela sua nova posição em Cristo e pela fé no Espírito que vive nele ou nela (3.1-5; 4.19; 5.4-5, 16, 25).

O crente em Cristo é um homem liberto! O que isso significa? Como isso deve afetar nossas vidas? A verdade bíblica nunca é irrelevante para nos orientar sobre como devemos viver.

A PERSPECTIVA HUMANA SOBRE A LIBERDADE

Paulo está tratando acerca da influência errada da perspectiva humana sobre a liberdade. Para o mundo (aqueles que agem fora dos absolutos divinos da Escritura) liberdade significa o direito de ser e fazer aquilo que você deseja, como deseja, quando deseja, onde deseja. Isto significa realizar sua própria vontade, sendo seu próprio chefe, preocupando-se com suas prioridades. O Webster’s New Collegiate Dictionary define liberdade como: "isenção de necessidade na escolha e ação".

Mas a Bíblia ensina, tanto quanto uma simples observação da vida, que tal definição ou perspectiva não é liberdade. Ao invés disso, é licença e desculpa para livrar-se das restrições morais de Deus, na busca de objetivos egoístas (Rm 1.18ss; Jo 3.19-21). Essa perspectiva resulta, eventualmente, em exploração dos outros, decadência moral, licenciosidade, como está se tornando cada vez mais evidente na nossa sociedade "faça sua própria vontade".

Este tipo de liberdade ou licenciosidade, como realmente é, também é ESCRAVIDÃO OU SUJEIÇÃO.

Esses tais são como fonte sem água, como névoas impelidas por temporal. Para eles está reservada a negridão das trevas; porquanto, proferindo palavras jactanciosas de vaidade, engodam com paixões carnais, por suas libertinagens, aqueles que estavam prestes a fugir dos que andam no erro, prometendo-lhes liberdade, quando eles mesmos são escravos da corrupção, pois aquele que é vencido fica escravo do vencedor. (2 Pe 2.17-19)

A PERSPECTIVA DIVINA SOBRE A LIBERDADE

Negativamente: O que Não é Liberdade

Paulo compreende que nós temos a perspectiva divina, o ponto de vista das Escrituras com respeito à verdadeira liberdade. Liberdade cristã nunca é liberdade para pecar ou fazer o que queremos.

Os gálatas, como muitos hoje, tendiam a um de dois extremos. Alguns estavam retornando para a lei como sinal de espiritualidade e retidão. Isto apenas servia para trazê-los de volta à servidão do poder da carne e à habitação interna e externa do pecado. Assim, para estes Paulo escreve 5.2-12. Tal posição sempre anula a nossa liberdade em Jesus Cristo, porque coloca nossa fé em objetos errados: o eu e a Lei. Isto é o que significa decair da graça: decair da provisão da graça contra o pecado. Isto não indica que perderam sua salvação. Significa que eles perderam a liberdade concedida pelo poder de Cristo. Legalismo produzirá apenas serviço, mas este será desagradável e oriundo de uma neurose generalizada, autopromoção cujos motivos são satisfazer as necessidades egoístas.

Outros, ouvindo acerca da sua liberdade em Cristo, pensaram que poderiam fazer aquilo que desejassem. Mas tal filosofia sempre resulta em falta de amor, egoísmo, exploração que ignora as necessidades de outros e age de maneiras que são prejudiciais para o Corpo de Cristo e para o propósito de Deus na igreja.

Então, para estes, o apóstolo escreveu Gálatas 5.13-14. "Servo" é o grego douleuete, um presente imperativo ativo de douleuo, "cumprir as exigências de um escravo ou servo". Isto é importante para notarmos que a maior ordem sobre a mutualidade é, de um modo ou de outro, demonstrar o coração de um servo. "Oportunidade" é aphorme que originariamente significava "ponto inicial" ou "base de operações", e então, "uma oportunidade, uma ocasião, um incentivo" ou "pretexto, desculpa".

Princípio: Nossa liberdade em Cristo e a abundante graça a nós concedida nEle nunca deve ser usada como uma desculpa para fazer o que desejamos e, no processo, ferir outros ou ignorar nosso chamado e obrigações diante de Deus e dos homens (Rm 5 – 6; Tt 2.11-14). Liberdade em Cristo jamais significa liberdade da presença e luta com a carne ou da habitação do pecado. Mas, tenciona a provisão do Espírito como o recurso de Deus de vitória (5.16-17). Conseqüentemente, nossa salvação e liberdade em Cristo nunca devem ser consideradas como liberdade das responsabilidades de serviço e amor aos outros (Rm 14 – 15).

Aqui reside um grande paradoxo do cristianismo. É interessante que Paulo, tendo advertido aqueles cristãos a não se tornarem, mais uma vez, escravos da lei e da carne, agora, exorta-os a tornarem-se servos, escravos uns dos outros, o que inclui, sem dúvida, serem escravos de Deus (1 Co 6.19; Rm 12.1). Este paradoxo é tremendamente instrutivo:

1. Escravidão mútua e para com Deus é absolutamente nada, se comparada à escravidão da carne e da Lei.

2. Escravidão à carne e à Lei resulta em morte, miséria e frustração. Isso causa em nós esgotamento, separando-nos com força uns dos outros.

3. Por outro lado, escravidão a Deus e mútua resulta na verdadeira liberdade e máxima bênção.

4. Escravidão ao pecado é involuntária, mas nunca neutra. É degenerativa e destrutiva tanto a mim quanto aos outros.

5. Escravidão à lei é voluntária, é o homem decidindo salvar a si mesmo. Assim, é tola, pesarosa, mas também, completamente carente para mudar nossas vidas por dentro, onde realmente importa.

6. Escravidão a Deus e mútua é voluntária. Mas é produto do amor e poder do Espírito Santo. Deste modo, se torna uma fonte de glória a Deus, e alegria, paz e bênção a mim e aos outros.


Positivamente: O que é a Verdadeira Liberdade

Liberdade não é o direito de fazer o que se deseja, mas o poder e capacidade tanto de querer como fazer o que se deve. Verdadeira liberdade jamais indica liberdade de responsabilidade, e responsabilidade não apenas para decisão, mas para decisões corretas. Liberdade é um contentamento interno com quem somos em Cristo e o que temos nEle. O que implica desejar apenas o tesouro celestial. Indica prontidão e capacidade para permitir que Deus esteja no controle de nossas vidas. Significa determinação em transferir o controle da própria vida para Cristo, e então, ele nos liberta psicologicamente e volitivamente para seguir o Senhor. Liberdade para a responsabilidade pessoal diante de Deus e do homem, debaixo da graça divina.

Um trem é uma boa ilustração porque é apenas efetivo quando está sobre os trilhos para os quais foi designado. Trihos não impossibilitam um trem, mas o capacitam a movimentar-se livremente, contanto que se movimente debaixo do poder do vapor ou combustível da locomotiva.

Mas vamos entender que a liberdade está particularmente ligada com os relacionamentos humanos, os quais procedem do correto relacionamento com Deus pela fé em Jesus Cristo e mediante o ministério do Espírito Santo. Esta é uma chave importante por todo o quinto capítulo de Gálatas. Cinco vezes o apóstolo usa "uns aos outros" em relação com a nossa liberdade – uma vez no verso 13, duas no 15 e duas no versículo 26. Em cada referência é central o ministério do Espírito Santo.

Isto é evidente nos nossos programas sociais. Os programas falham em trabalhar efetivamente, porque o homem é incapaz de realizá-los de maneira efetiva. Paulo sabia que para sermos capazes de servir uns aos outros em amor, precisaríamos de força de uma outra fonte no lugar de nós mesmos, e necessitaríamos lidar com nosso homem interior, honestamente, mediante a confissão e o poder da habitação do Espírito de Deus.

Marcos 8.33-35 mostra que a verdadeira liberdade procede de um total compromisso com Jesus Cristo. Na perda de nossas vidas em devoção a Ele e Seus propósitos e na transferência do controle de nossas vidas para Ele, encontramos a verdadeira liberdade – a liberdade para ser aquilo que fomos designados para ser e, assim, experimentar a verdadeira alegria. O uso de nossa liberdade para favorecer a nós mesmos nunca satisfaz o âmago dos desejos do coração. Ao invés disto, destrói a capacidade da alma de se relacionar com outros e conduz, também, à negligência dos outros ou sua exploração. Então, existimos para, voluntariamente e por amor, servir uns aos outros como escravos do Senhor.

Ser um servo de Cristo acarreta para nós o serviço aos outros porque por estarmos em Cristo, somos parte de Seu Corpo e membros uns dos outros.

NOSSA PRECAUÇÃO: UMA ADVERTÊNCIA CONTRA A LICENCIOSIDADE

Uma filosofia licenciosa sempre resulta em falta de amor, egoísmo, exploração que ignora as necessidades mútuas e age de maneiras prejudiciais para o Corpo de Cristo e para o propósito divino para a igreja. Então, para este fim, o apóstolo escreveu Gálatas 5.13-26.

Nosso Dever: Servir uns aos outros por Amor

O amor cumpre a lei:

Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor. Porque toda a lei se cumpre em um só preceito, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos. (Gl 5.13-15)

Com respeito à exposição de Paulo no verso 15, Warren Wiersbe escreve:
Este verso dá razão para o que vem antes (perceba a partícula gar no v. 14). Liberdade em Cristo não ignora a lei, mas cumpre os próprios requerimentos santos por meio daquilo que é sua essência, amor ao próximo. "Se você ama ao próximo (por amar a Cristo), você não irá roubá-lo, se aproveitar dele, invejá-lo, ou tentar de alguma maneira ferí-lo".

Amor que vem de dentro por meio do ministério do Espírito Santo, tendo as Escrituras como nosso guia sobre a prática do amor, cumpre a Lei.

Conseqüências a Evitar: Canibalismo Carnal Cristão

Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos. (Gl 5.15)

Quando não servimos uns aos outros, invariavelmente, acabamos devorando uns aos outros. Esta é a alternativa. Parece não haver, no final das contas, nenhuma neutralidade – assim, nós vivemos para os outros ou vivemos para nós mesmos.

NOSSA CONFIANÇA: A PROVISÃO DE DEUS DO ESPÍRITO

Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. (Gl 5.16)

Neste ponto mora o segredo. Não por meio do temor da lei, mas por meio do ministério pessoal do Espírito Santo venceremos a carne ou a natureza pecaminosa, como é conhecida.

A Ordem
"Andai no Espírito". "Andai" é um imperativo, uma ordem. Ainda que não estejamos debaixo da lei, não estamos livres da responsabilidade de escolhas certas. Como uma ordem, isto, também, inclui a capacidade para cumprí-la. No texto grego, o tempo verbal é o presente que denota ação contínua, indicando a necessidade de andar momento após momento, passo a passo na dependência do Espírito. "No Espírito" destaca o Espírito Santo como agente e o recurso, e assim, a força pela qual devemos viver.

A Promessa
"E jamais satisfareis à concupiscência da carne". "Jamais" é ou me uma forte negação, "nunca!". "Satisfareis" é teleo, no grego significa "levar a um final, concluir, realizar" ou "efetuar, executar, levar a cabo". "Concupiscência da carne" refere ao problema que todos nós enfrentamos da contínua atividade da natureza pecaminosa, a propensão para o pecado que continua a existir ainda na vida do salvo. Enquanto vivemos nesta vida, nunca estaremos completamente livres dos maus desejos que se originam da nossa natureza humana decaída. Podemos experimentar vitória sobre eles, mediante o Espírito Santo.

NOSSO CONFLITO: A BATALHA ENTRE A CARNE E O ESPÍRITO

Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. (Gálatas 5.17)

Neste verso o apóstolo expõe o porquê da necessidade de andar no Espírito, isto é, ter uma vida controlada e movida pelo verdadeiro Espírito de Deus. A exposição é encontrada no fato do intenso conflito entre o Espírito e a carne. Ainda que nos encontremos judicialmente mortos para a natureza pecaminosa e seu poder e possamos experimentar a libertação originada da nova vida em Cristo, mediante a união com Ele, a natureza pecaminosa, todavia, não está erradicada. Bartlett apresenta uma boa observação neste ponto. Ele escreve:

A aceitação de Cristo no coração, inevitavelmente, provocará uma amarga e determinada resistência da parte da velha natureza pecaminosa, a qual, até agora, possuía tudo do seu próprio modo. Nem a carne será levada a dormir pela tola ilusão que está morta e sepultada. É imperativo para o nosso crescimento espiritual compreendermos o fato de que a velha natureza não é removida ou reformada na regeneração. A falha em entender este fato elementar, freqüentemente, lança o novo convertido numa desnecessária confusão e desespero com respeito à sua posição perante Deus, quando depois de um sereno período de triunfo e comunhão com Jesus, ele tropeça em seus antigos pecados e cria a fantasia de que foi vencido para sempre. Com antigos cristãos este erro, freqüentemente, produz resultados completamente diferentes. Convencidos de que não podem pecar, partidários da heresia da perfeita santidade negarão que as práticas denunciadas pela Palavra de Deus como pecado, de fato são. O sujeito que pensa que alcançou tal perfeição é vítima de uma certa ilusão, na qual se encontra desesperadamente necessitado de um novo par de óculos, a fim de evitar uma ameaçadora escravidão.

NOSSA CONQUISTA: A LIBERTAÇÃO DA LEI POR MEIO DO ESPÍRITO

Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei. (Gl 5.18)

Mais uma vez, isto não significa que os cristãos estão livres de responsabilidades e imperativos para obedecer. O Senhor disse: "Se vocês me amam, guardarão os meus mandamentos". A questão é que nós temos um novo sentido de vida. Da mesma forma que a justificação não acontece mediante obras da lei, também, a santificação não pode ser alcançada pelo empenho humano. O crente não é espiritual porque mantém um conjunto de princípios ou imperativos. Mas, mantém os imperativos da Escritura porque é espiritual.

Estar debaixo da lei é estar debaixo de sua autoridade como regra de vida, e assim, tentar manter isso como um meio de santificação.

Artigo Disponível em inglês no site http://www.bible.org/
Tradução: Tiago Abdalla T. Neto

O PROCESSO DO PECADO SEXUAL
Steve Viars

O artigo abaixo é uma sinopse da sessão plenária de Steve Viars na pré-conferência do NANC 2003 sobre "Pecado Sexual".


Nós vivemos numa cultura enlouquecida pelo sexo. Num ano recente, a U.S. News e a World Report declararam que a indústria pornográfica arrecadou mais que oito bilhões de dólares, ultrapassando todas as receitas geradas pela música country e o rock, sendo mais do que a América gastou com as produções da Brodway, teatro, balé, jazz e música clássica juntos. O web site da Playboy sozinho recebe cinco milhões de acessos todos os dias.

A Long-On Data Corporation informa que são 72.000 sites de sexo explícito na internet, com uma estimativa de 266 novos sites pornográficos adicionados a cada dia. O efeito da pornografia sobre as tendências do relacionamento social é, também, importante. Estima-se que uma em cada três garotas e um em cada sete rapazes serão molestados sexualmente antes dos dezoito anos. Algumas estatísticas sugerem que um molestador típico de crianças se aproveitará de mais que 360 vítimas durante seu tempo de vida e será capaz de abusar entre trinta e sessenta crianças antes que seja pego pela primeira vez. Num estudo sobre molestadores de crianças condenados, 77% que abusaram de garotos e 87% de garotas disseram que foram consumidores regulares de pornografia hard-core.

Mais uma situação que deve, sem dúvida, chamar nossa atenção como líderes é que conforme a entidade Focus on the Family, uma em cada sete chamadas recebidas no seu serviço de aconselhamento para pastores inclui a pornografia de internet.

Tiago 1.14-15 menciona três princípios para ajudar o povo de Deus a vencer o combate com o pecado sexual:

Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.

Aprenda que o pecado sexual é um processo que começa bem antes do ato.

O ponto central do texto é que o pecado sexual envolve alguns passos específicos e identificáveis. A fonte da tentação são as nossas cobiças, da palavra grega epithumia. Conselheiros bíblicos seriam sábios se aprendessem tudo o que podem sobre este conceito bíblico particular.

Deus nos fez seres que desejam. Esta é a chave para entender a motivação humana. Parte do processo de aconselhamento é ajudar homens e mulheres a identificarem os desejos de seus corações, especialmente em situações em que eles desagradam a Deus regularmente. Geralmente, faço duas perguntas no aconselhamento: "O que você quis tão perversamente que se dispôs a pecar, a ponto de fazer isso?" e "O que você quis tão perversamente que se dispôs a pecar, quando não deveria fazer isso?". Fundamentalmente, isso é um resultado da idolatria porque os desejos de uma pessoa revelam o seu deus funcional.

Com certeza, alguns podem contestar que é impossível controlar seus desejos. Esta é uma questão teológica central que precisa ser debatida. O Kittle’s Theological Dictionary of the New Testament explica que epithumia é "um impulso da vontade". Em outras palavras, nós escolhemos aquilo que queremos.

Tiago, também, explica nesta passagem que se nós não controlarmos nossos desejos com a verdade bíblica, eles terão poder para nos seduzir e nos afastar. O quadro aqui é de um peixe fisgado ou de um animal que caiu em armadilha. Alguns podem se sentir desconfortáveis com os seres humanos sendo apresentados como se fossem animais, já que fomos feitos à imagem de Deus. Mas, eu creio que precisamos reconhecer a capacidade dos seres humanos para viver bem diferente dos animais, apenas se escolherem viver no poder de Deus. No outro lado desta equação, se os seres humanos escolhem rejeitar a Deus e Sua Palavra, muitas das escolhas de seu estilo de vida irão escravizá-los absolutamente. Eles experimentarão fraqueza e vício como um animal que caiu em armadilha.

O próximo passo nesse processo é um ato pecaminoso. É interessante e sensato perceber que Tiago movimenta as metáforas aqui. Desejos incontrolados dão à luz ações pecaminosas. Isso não significa que os desejos precedentes são neutros ou aceitáveis, mas agora, as ações pecaminosas são "seres" gerados por um coração pecaminoso.

A questão central é que nossos aconselhados nunca alcançarão melhora nesta área de suas vidas, até entenderem que o pecado sexual é um processo que começa bem antes do ato.

Aprenda a parar o pecado sexual onde ele começa pelo poder de Deus.

Uma das implicações de conhecer esse processo é identificar a cobiça ou o desejo específico do coração que conduziu ao comportamento. Pessoas pecam sexualmente por diferentes razões. Algumas das cobiças comuns que levam ao pecado sexual são:

A. Desejo por gratificação imediata…
O pecado sexual, especialmente quando é pornografia de internet, prostituição ou infidelidade conjugal produz uma sensação pessoal de um modo particular sem precisar percorrer o difícil trabalho relacional. O sujeito quer prazer que vem com o relaxamento sexual sem a necessidade de caminhar pelo empenho do envolvimento relacional na construção de um casamento piedoso.

B. Desejo pela aprovação do homem
No pecado sexual, em nível de coração, a pessoa é o grande homem do campus da Universidade, a mais bela pessoa da praia, a pessoa mais atrativa do escritório. Então, imaginam outras pessoas lisonjeando sua sexualidade de maneira que nunca ocorreria na vida real. É por isso que, provavelmente, as pessoas envolvidas em pornografia se tornam violentas, freqüentemente. Porque as pessoas da vida real não as tratam como as das suas fantasias. É basicamente o pecado do orgulho, uma forma vulgar de amor próprio que deseja ser o centro do drama, o herói do jogo.

C. Desejo por controle
No pecado sexual, a pessoa se encontra no comando de tudo e de todos. Não há perguntas ou recusas. É a estrela do filme, o diretor do filme e o telespectador, também.

D. Desejo de ser Deus
Esta pessoa deseja uma vida em que não haja conseqüências, causa e efeito e nem regras: apenas determine o que você quer. Esta pessoa crê que pode pensar e fazer aquilo que deseja, não mantém limites.

Uma vez que tais desejos são identificados, é hora de mortificá-los. O impacto do evangelho no progresso da vida do crente não é apenas uma mensagem de vida e ressurreição, mas também, de morte e crucificação. Esta é a raiz do verdadeiro ódio ao pecado, não apenas o pecado das ações sexuais, porém, ainda, dos pensamentos sexuais ilícitos.

A próxima implicação do entendimento do processo é optar por desejos que honrem a Deus. Os passos que Tiago descreve podem ser revertidos, na demonstração do amor de alguém por Cristo mediante a escolha de desejos na vida sexual de alguém que o honra.

Esteja convencido de que as conseqüências em falhar na interrupção deste processo são severas.

Tiago completa a metáfora pela descrição de um aborto: "quando o pecado é completado, produz morte". Homens e mulheres pegos pelo pecado sexual sofrem a morte espiritual de ser um estranho para Deus.

É, ainda, a morte de relacionamentos. Recentemente, uma de minhas aconselhadas descobriu que seu marido estava envolvido com pornografia de internet. Ela descreveu a lenta morte de seu casamento em palavras como estas: "Eu sabia que algo estava errado, mas sempre pensei que eu fosse a responsável. Eu cri que se perdesse mais peso ou se eu tentasse mais intensamente satisfazê-lo, as coisas melhorariam. Eu estou tão irada, doente, confusa e desapontada ao descobrir que todo este tempo ele tinha uma amante".

Com certeza, a boa notícia é que "onde abundou o pecado, a graça superabundou" (Rm 5.20). Todo seguidor pode aprender a "possuir seu próprio corpo em santificação e honra" (1 Ts 4.4). Deus nos informou acerca do processo, a fim de que o revertêssemos no momento mais cedo possível.

Ver cristãos praticarem esse princípio é exatamente o que a nossa cultura enlouquecida pelo sexo precisa.
Artigo em inglês disponível em http://www.nanc.org/
Tradução: Tiago Abdalla T. Neto
REPENSANDO A AMIZADE

Amizade é um tema bem amplo e, muitas vezes, esquecido, sem muita reflexão de nossa parte. Como bem destacou C.S. Lewis, poucos poemas ou romances modernos celebram o amor encontrado na amizade. Talvez, o real motivo por trás dessa desvalorização da amizade seja o fato de que raros são aqueles que a experimentam realmente.

É comum nos encontrarmos, em momentos, refletindo sobre a dificuldade de achar bons amigos. Como gostaríamos de experimentar a amizade de Davi e Jônatas! Mas, como isso parece impossível! Raramente, pensamos que o problema se encontra em nós, geralmente, são os outros que "não estão à nossa altura". A grande verdade é que a Bíblia nos fornece exemplos diversos de amizade e mostra a possibilidade de desenvolvermos relacionamentos com profundidade e lealdade. Nem todos serão amigos íntimos, com quem rasgamos nossos corações, mas, certamente, há aquele "mais chegado do que um irmão".

Quando avaliamos o propósito e objetivo de uma amizade, não podemos deixar de fazê-lo a partir das Escrituras. Elas são as lentes pelas quais enxergamos a vida, pois somente elas nos conduzem à perfeição das ações que Deus requer de nós (2 Tm 3.16, 17).

Diante, disso, nosso propósito maior em tudo o que fazemos deve ser a glória de Deus (1 Co 10.31). Ao dar a Sua vida pelos seus amigos, Jesus estava promovendo a glória do Pai (Jo 15.12-13 com 17.1-4). A fim de atingir este propósito, a Bíblia nos orienta sobre alguns objetivos que devemos buscar com a amizade.

Em primeiro lugar, a amizade deve focar o aperfeiçoamento do caráter daqueles com quem compartilhamos momentos juntos (Pv 27.17). Tal aperfeiçoamento deve caminhar rumo ao caráter de Cristo (Rm 8.29). Isso requer de nós esforço impulsionado e experimentado pela esfera de vida no Espírito Santo (Rm 14.17-19). Contribuir para o crescimento espiritual de meu amigo e irmão em Cristo inclui tanto apontar erros que precisam ser corrigidos (Pv 27.5-6; Gl 6.1-2) quanto ser presente nos momentos difíceis (Pv 17.17).

Um segundo objetivo que devemos focar numa amizade é desenvolver o amor sacrificial pelos outros. A Bíblia diz que o solitário está em busca apenas de seus próprios interesses (Pv 18.1). Quando imitamos o amor sacrificial de Cristo por nós, tendo essa mesma atitude na direção de nossos irmãos, então, verdadeiramente se evidenciará que somos discípulos do Mestre (Jo 13.34-35). Nós amamos porque Deus nos amou primeiro (1 Jo 4.9-10, 19).

Este amor é visível em nós quando somos humildes na nossa atitude para com os outros, considerando os outros mais importantes que nós, focando nas necessidades do outro, antes que nas minhas (Fp 2.3-8). É perdoar nossos amigos quando estes falham conosco, evitando a difamação e amargura (Ef 4.31 – 5.2; Fp 4.2-3).

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

A RESPOSTA BÍBLICA PARA A VIOLÊNCIA

No ano de 2006 presenciamos o caos que a violência pode causar dentro da sociedade quando não é tratada da maneira adequada. Milhares de trabalhadores refugiados em suas casas, sem poderem realizar a lida do dia-a-dia. Policiais e familiares correndo o risco de vida, simplesmente por serem responsáveis pela detenção de criminosos. Patrimônio público e privado como o alvo de destruição. Será que nosso mundo virou de ponta-cabeça? Presenciamos uma ordem onde o mal governa, enquanto o bem se encontra indefeso, sem condições de reação?

Essas eram perguntas que ecoavam nas mentes de milhares de brasileiros cujas vidas foram afetadas pelos atos terroristas do famoso Primeiro Comando da Capital, popularmente chamado de PCC. Depois de alguns meses, começamos a respirar com mais tranqüilidade, todavia, isso não significa que estamos imunes à violência. Afinal de contas, esse ato em massa fora apenas o reflexo daquilo que, diariamente, presenciam milhões de pessoas. É o seu José, que perdeu o filho, morto por traficantes; ou a Maria que saiu para o seu trabalho e fora agredida por assaltantes. É o americano, alvo do ódio de terroristas islâmicos e o palestino que perde familiares na faixa de Gaza. A realidade não pode ser negada.

Como enfrentar tal questão? Existe solução para o problema violência? A Bíblia fornece resposta consistente e confiável para este dilema. Como um mal, a violência teve sua concepção na queda do homem dentro Jardim do Éden, ao rejeitar o bem que Deus havia revelado e preparado para ele. Apesar disso, Deus nunca deixou de propiciar-lhe a oportunidade de reatar a comunhão e praticar o bem, e continuou revelando Seus atributos e vontade.

Foi assim com Caim, quando o Senhor não o aceitou e nem a sua oferta (Gn 4.1-5), aquele ficara enfurecido por não se agradar do veredicto do Criador. Deus, bondosamente, se revela a Caim, questiona o motivo de sua ira e lhe oferece a escolha de dominar seus sentimentos (Gn 4.6, 7). Todavia, o homem, mais uma vez, resolve fazer de seu próprio jeito, o que culmina na violenta morte de Abel (Gn 4.8).

A incapacidade humana de conter a violência durante a história de sua existência pós-queda, apenas demonstra que alguém cuja impiedade é inata desde cedo (Gn 8.21; Sl 51.5; Rm 7.18) produzirá o mal contra seu semelhante (Mc 7.20-23) e nunca satisfará a plena justiça de Deus (Rm 3.9-20). Bastam os exemplos dos filhos de Jacó ao buscarem fazer justiça com as próprias mãos contra os moradores de Siquém (Gn 34.13-31), a guerra civil da nação de Israel na época dos juízes (Jz 19 – 21), a vingança de Absalão pelo estupro de sua irmã (2 Sm 13.23-39) e, o ápice da crueldade humana, na crucificação de Jesus Cristo, o próprio Deus encarnado (Is 53.1-9; At 2.36; 3.13-15; 4.27).

A solução, portanto, se encontra no Deus que se revela e que desde Caim, oferece ao homem a oportunidade de abandonar a violência. A Bíblia, na qualidade de Escrituras Sagradas é a própria Palavra de Deus, isto é, Sua revelação (2 Tm 3.14-16) e, somente por meio dela, podemos ser capazes de produzir qualquer boa obra (2 Tm 3.17).

As Escrituras deixam claro que a reconciliação horizontal entre os homens só pode ocorrer mediante a reconciliação vertical com Deus (Ef 2.11-18). Tal reconciliação se efetua apenas mediante a Pessoa de Cristo (Ef 2.1-7) e Sua obra na cruz (Rm 5.1, 6-11; Hb 9.27-28; 1 Jo 4.10), e é recebida pelo homem, exclusivamente pela fé (Ef 2.8, 9). Ao perceber o imenso amor de Deus, o crente em Cristo é compelido a amar (1 Jo 4.10-12, 19-21) e, assim, a perdoar liberalmente, como Ele o perdoou mediante a oferta de Jesus (Ef 4.31 – 5.2). Qualquer outra tentativa de reconciliação entre os homens, será uma mudança superficial, mero legalismo. Pois tal amor é derramado pelo Espírito Santo, com exclusividade, naqueles que confiaram no imensurável amor divino que concedeu perdão aos que antes eram seus inimigos (Rm 5.5-11).

Urge, então, mostrar aos homens sua imensa dívida para com Deus e o pagamento dela por meio da obra de Cristo, para que percebam o quão pequena é a dívida de seu próximo para consigo e perdoem com generosidade (Mt 18.21-35). A partir daí, é que fazem sentido as palavras de Jesus sobre oferecer a outra face, andar duas milhas e amar tanto o próximo quanto o inimigo, refletindo o amor do Pai (Mt 5.38-48). Assim, será possível abençoar os que nos perseguem, dar de comer e beber ao adversário que tem fome e sede (Rm 12.14-21) e não revidar aos que nos insultam e prejudicam (1 Pe 2.18-25).

A violência só será vencida pela revolução do amor que começa no Deus Triúno e passa a ser vivenciada, por pura graça, entre os homens!

ENTRE O BEM E O MAL:
Os limites entre a religiosidade cega e a espiritualidade verdadeira
Marcos 3.1-6

INTRODUÇÃO
A maioria de nós nunca se esquecerá do ocorrido no dia 11 de Setembro de 2001. Um avião pilotado por um terrorista muçulmano vai na direção de uma das torres gêmeas, em Nova York, e se choca com ela. Um desastre! Centenas de pessoas mortas em um incidente jamais esperado antes. Familiares e amigos choram profundamente seus mortos e a nação americana entra em choque.

Se fossem indagados sobre a razão do atentado, certamente, os homens que estavam no avião argumentariam que fizeram isso em nome de Deus. "Os americanos cristãos são infiéis que devem ser atacados numa guerra santa e é isto o que fizemos, ao destruirmos milhares de vida" - diriam.

A intolerância religiosa sempre existiu na história. Um outro exemplo disso foi a morte na fogueira, sentenciada pela Igreja Católica do pregador da Boêmia, John Huss. Ao defender a autoridade das Escrituras acima do papa, acabou por se tornar vítima de religiosos que não admitiam, de forma alguma, a existência de um pensamento diferente do seu.

Esses acontecimentos nos alertam para o perigo de fazer nossa religiosidade um fim em si mesma. Talvez, nunca cheguemos a matar uma pessoa, na preocupação de manter nosso status religioso, mas, provavelmente, já prejudicamos e ferimos várias delas. Um texto das Escrituras nos protege contra para o perigo da religiosidade cega. Aquela religiosidade cujo deus é o próprio homem e seu anelo insaciável de reconhecimento e poder.

Quero me dirigir com você para o livro de Marcos, capítulo 3. Ali, nos primeiros seis versículos, encontraremos três cenas que mostram a religião fria dos fariseus e o antídoto para ela, na espiritualidade verdadeira demonstrada por Jesus. Se quisermos fugir do legalismo ou do orgulho religioso, precisamos seguir as pisadas do Mestre e aprender sobre a espiritualidade que é segundo o coração de Deus. Convido-o (a) a ler Marcos 3.1-6 e refletir sobre esta passagem:

3. 1Noutra ocasião ele entrou na sinagoga, e estava ali um homem com uma das mãos atrofiada. 2Alguns deles estavam procurando um motivo para acusar Jesus; por isso o observavam atentamente, para ver se ele iria curá-lo no sábado. 3Jesus disse ao homem da mão atrofiada: "Levante-se e venha para o meio".
4Depois Jesus lhes perguntou: "O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar a vida ou matar?" Mas eles permaneceram em silêncio.
5Irado, olhou para os que estavam à sua volta e, profundamente entristecido por causa do coração endurecido deles, disse ao homem: "Estenda a mão". Ele a estendeu, e ela foi restaurada. 6Então os fariseus saíram e começaram a conspirar com os herodianos contra Jesus, sobre como poderiam matá-lo. (NVI)

A AMEAÇA DA RELIGIOSIDADE CEGA – vv. 1-2
No texto anterior ao nosso, Marcos tratou sobre o confronto de Jesus com o legalismo dos fariseus, quando seus discípulos colhiam espigas e comiam no dia de Sábado (Mc 2.23-28). A parte final resumiu o ensino de Jesus de que o sábado fora estabelecido para o bem do homem, para serví-lo e não o contrário (2.27). Além do mais, Ele próprio é o Senhor do sábado, aquele que determina o seu propósito e como deve ser vivido pelos homens (2.28).

Em Marcos 3.1-6, o sábado continua sendo a moldura do quadro, ainda que a situação pintada seja diferente. Como era comum nesse dia, havia o culto na sinagoga e Jesus estava presente. Mas além dele, havia outra pessoa especial, um homem cuja mão era ressequida, atrofiada.

Não bastavam eles, o texto traz consigo outras personagens. Não fala quem são, mas diz que estavam observando cuidadosamente a Jesus, para ver se curaria o doente no dia de sábado. A NVI descreve bem a atitude deles como "o observavam atentamente". O verbo grego indica uma ação cuidadosa, de olhar com muita atenção na busca por encontrar uma falha ou um erro. Recordo-me de uma situação que ilustra essa atitude. Quando criança, minha mãe havia chamado a minha atenção por algo que eu fiz de errado. E, como é natural de uma criança rebelde quando repreendida, esperei ela sair e comecei a murmurar e reclamar comigo mesmo. Só que não havia percebido que ela estava atrás da porta, observando qual seria a minha reação. Foi só eu começar a murmurar com raiva, que ela saiu detrás da porta para me corrigir. É esse tipo de atenção cuidadosa como a da minha mãe que marcou a postura daqueles que se fixaram em Jesus.

Graças a Lucas, sabemos que tal grupo era formado por fariseus e escribas (Lc 6.7). Esses religiosos e líderes religiosos tinham uma finalidade astuta ao prestarem a atenção em Jesus. Queriam acusá-lo! Não, simplesmente, sair difamando, mas, como deixa claro as ocorrências desta palavra em outros textos, tinham como propósito uma acusação formal diante de uma autoridade civil (cf. Mt 27.12; Mc 15.3; Lc 11.54; 23.2,10, 14; Jo 5.45; At 22.30). Pois, em sua tradição, um médico não deveria curar nenhum doente em dia de sábado. Apenas quando o doente corresse real risco de vida, poderia, então, fazer isso. Curá-lo, indicaria trabalho e trabalho no sábado requer a pena de morte (Êx 31.14-17).

A questão é que o Antigo Testamento proibiu o trabalho no sábado que implicasse em produtividade. Deus queria que o homem não se transformasse numa máquina de produção ou de ganhar dinheiro, mas sim, num adorador. E, parte disso, incluía dedicar um dia da semana para lembrar do desejo de Deus de que O adoremos, afastando o perigo da rotina controladora.

Esses homens, no lugar de usar o sábado como um dia de adoração a Deus, estavam fazendo dele um dia de adoração a si mesmos, preparando uma armadilha para, no final das contas, matarem Jesus. O sábado acabou se tornando um dia do cultivo do próprio ódio que havia dentro deles, no lugar de cultivarem o amor para com Deus e com o próximo. Em nome de Deus, queriam matar o próprio Deus-homem porque confrontava a sua religiosidade legalista.

Alguns maus usos de nossa religiosidade podem ser:

Uma forma orgulhosa de defendermos a verdade, de modo que deprecie, desrespeite e humilhe o nosso próximo, sem mostrar a esperança da graça transformadora em Cristo.
A atitude de alguém que procura esconder e acobertar suas falhas, sempre se passando como uma pessoa muito espiritual, em quem é impossível encontrar erros. A tendência dessa pessoa é não se humilhar nem buscar a ajuda de algum irmão que possa lhe aconselhar e orar juntos pela sua dificuldade.

Uma atitude de "caça as bruxas" dentro da igreja. Buscando sempre ver falhas e defeitos nos outros, comentando isso com pessoas. Afinal, isso o (a) faz sentir bem, ao perceber que não é tão mal (má) quanto os outros.

O outro lado da moeda é procurar expor meus "feitos espirituais", isto é, a grandeza de meu ministério na igreja, a minha intimidade profunda com Deus, meu vasto conhecimento bíblico, etc., buscando o louvor e respeito das pessoas.

A CONSTÂNCIA NA BUSCA DO BEM – vv. 3-4

O que os religiosos se esqueceram é que este homem é o mesmo que desvendou seus corações quando pensavam consigo mesmos, indignados, sobre o fato dEle declarar perdão de pecados ao paralítico em 2.1-12. E, assim sendo, chama o homem da mão ressequida para o meio, isto é, para um lugar central, onde ficasse diante dEle e dos fariseus, para mais uma vez revelar seus pensamentos.

Jesus coloca lado a lado as suas intenções com as dos fariseus. A pergunta sobre "O que é permitido?", já havia aparecido em 2.24 na boca dos fariseus. Agora é Jesus quem fala sobre o certo e o errado, e lança isso a eles. "O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar a vida ou matar?". Jesus buscava fazer o bem ou, como é freqüentemente usado o verbo "salvar" na Bíblia, Jesus queria "curar" o doente. Ao passo que a intenção dos religiosos era, desde o início, matar Jesus mediante suas acusações e, portanto, fazer o mal. Jesus ataca a religiosidade que se contenta em cumprir regras, sem enxergar a perspectiva maior da glória de Deus e do bem ao próximo. Deus várias vezes havia criticado seu povo por essa pretensa religiosidade, como é o caso de Isaías 58.2-8:

Pois dia a dia me procuram; parecem desejosos de conhecer os meus caminhos, como se fossem uma nação que faz o que é direito e que não abandonou os mandamentos do seu Deus. Pedem-me decisões justas e parecem desejosos de que Deus se aproxime deles.
‘Por que jejuamos’, dizem, ‘e não o viste? Por que nos humilhamos, e não reparaste?’
Contudo, no dia do seu jejum vocês fazem o que é do agrado de vocês, e exploram os seus empregados. Seu jejum termina em discussão e rixa, e em brigas de socos brutais.
Vocês não podem jejuar como fazem hoje e esperar que a sua voz seja ouvida no alto. Será esse o jejum que escolhi, que apenas um dia o homem se humilhe, incline a cabeça como o junco e se deite sobre pano de saco e cinzas? É isso que vocês chamam jejum, um dia aceitável ao SENHOR?
"O jejum que desejo não é este: soltar as correntes da injustiça, desatar as cordas do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e romper todo jugo? Não é partilhar sua comida com o faminto, abrigar o pobre desamparado, vestir o nu que você encontrou, e não recusar ajuda ao próximo?
Aí sim, a sua luz irromperá como a alvorada, e prontamente surgirá a sua cura; a sua retidão irá adiante de você, e a glória do SENHOR estará na sua retaguarda. (NVI)

Creio que Jesus faz o mesmo com os fariseus e mestres da lei. Confronta seu legalismo com o verdadeiro espírito da lei. A questão de dias é secundária, quando está em jogo o bem ou o mal. Sempre deve se praticar o bem, assim como sempre se deve evitar o mal. "Quem sabe que deve fazer o bem e não o faz, comete pecado" (Tg 4.17).

Um modo bem claro como praticamos o mal no lugar do bem é quando nos preocupamos muito mais com a estrutura, os projetos e programas de nossa igreja, em lugar de nos concentrarmos na intimidade com Deus e no bem do outro. Quando pensamos mais na estrutura, ignoramos o uso de nossos recursos financeiros para ajudar irmãos e pessoas que precisam ou para levar a mensagem do evangelho àqueles que ainda não conhecem a Cristo.

Quando damos ênfase demasiada aos nossos projetos e programas, pessoas podem se tornar um obstáculo, no lugar de serem o alvo. Já vi líderes e membros de igreja pisarem em outros devido a um programa dar errado ou não acontecer do jeito que gostariam. Já vi pessoas causarem intriga e tumulto na igreja porque um determinado irmão não quis participar de seu projeto.

Também, já vi líder de igreja que está tão preocupado, mas tão preocupado em fazer a sua igreja crescer, explodir numericamente, que nela se encontra um número grande de famílias destroçadas, "como ovelhas que não têm pastor".

Além disso, nosso serviço nunca poderá ser um substituto para a nossa intimidade com Deus. Há um ativismo muito grande em nossas igrejas, sem uma profundidade real em sua espiritualidade.
Queridos, nunca nos esqueçamos do que o Senhor requer de nós, daquilo que é bom, "que pratiques a justiça e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus" (Mq 6.8).

A AÇÃO DIRIGIDA POR DEUS – vv. 5-6

O Senhor Jesus não se deixou levar pela pressão dos religiosos. Ele, literalmente, se ira, mas, também, se entristece. A ira de Jesus é justa, assim como Deus manifesta a cada dia o seu furor contra aqueles que decidem permanecer em rebeldia a Ele (Sl 7.11). A tristeza que sente é porque mais miserável que a condição do homem de mão atrofiada, é o coração endurecido dos fariseus. Endurecimento esse que Paulo falará mais para a frente em Romanos 11.25 e que resulta em alienação de Deus e cegueira espiritual (Ef 4.18). Esses homens se tornaram insensíveis, insensíveis para compreender a vontade de Deus e insensíveis para amar o próximo.

Movido pela vontade de Deus, não pelo temor dos homens, Jesus cura aquele doente, sem precisar tocá-lo, simplesmente, falando. A mesma palavra criadora de Gênesis 1: "Haja luz" e houve luz, é restauradora aqui: "Estenda a mão", ele a estendeu e ela foi restaurada.

Eles não conseguiram o que queriam! Jesus nada fez, apenas falou! Por isso, como deixa claro o texto paralelo em Lucas, "eles ficaram furiosos" (Lc 6.11). E começaram a tramar com os herodianos, um grupo político de ideais completamente diferentes, como matariam Jesus. Sua intenção ficou clara aqui, usavam o sábado para fazer o mal.

Nosso Senhor deixou seu exemplo da verdadeira espiritualidade. Ela se expressa num coração sensível para compreender a vontade de Deus nas Escrituras e em amor na direção do próximo. "Nós amamos porque Ele nos amou primeiro. Se alguém afirmar: ‘Eu amo a Deus’, mas odiar seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê" (1 João 4.19-20).

A nossa sensibilidade em ouvir a voz de Deus nas Escrituras e em praticá-las é proporcionalmente inversa ao temor que temos das pessoas. O temor dos homens marcava o caráter dos fariseus, preocupados com seu status e reputação. Preocupados em não permitir que nada e ninguém, nem Jesus, ameaçassem seu retrato de piedade.

Ao passo que o nosso Senhor agiu motivado por Deus. Sabia o que Seu Pai queria e cumpriu o seu propósito, ao salvar aquele homem da mão atrofiada. Não se preocupou com sua imagem perante os poderosos e influentes religiosos de sua época. Apenas fez o que devia.

O que determinará se seremos religiosos cegos, famintos pela própria glória, ou se cultivaremos uma espiritualidade genuína que agrada a Deus, será nossa disposição em ouvir a voz de Deus ou a dos homens. Seremos sensíveis ao que Deus pede de nossas vidas e obedeceremos? Ou viveremos uma religiosidade fria, preocupada com as aparências e a manutenção do nosso muro religioso? A quem amaremos mais: a Deus e ao próximo, ou a nós mesmos? A resposta para essas perguntas será essencial na direção de nossa espiritualidade.

ARMADILHAS DO CORAÇÃO
Êxodo 32.1-8


INTRODUÇÃO
Você já parou para pensar o quanto somos idólatras? O quanto dependemos de outras coisas e colocamos nossa confiança em objetos ou pessoas que não são o Deus verdadeiro?
A televisão e a mídia nos ensinam isso:

‘Se você tiver o carro tal, aí você será feliz...".
"Faça sua conta no banco tal e seus problemas acabarão".
"Imagem não é nada, sede é tudo, satisfaça sua sede!", dizia a antiga propaganda do refrigerante Sprite.

Todas essas propagandas e muitas outras apontam na direção de objetos, fazendo deles extremamente necessários e fundamentais para a nossa vida. Como se nossa vida não pudesse continuar e seguir adiante sem aquilo que a propaganda oferece.
Influenciados pela Teologia da Necessidade, compramos a idéia moderna. Achamos que precisamos de certas pessoas ou coisas sem as quais jamais poderemos viver. Por isso, quero compartilhar com vocês algo que tenho aprendido em minha caminhada com o Senhor. Peço que vocês se dirijam comigo lá para o livro de Êxodo, no capítulo 32, versos de 1-8 e encontraremos ali, duas armadilhas.


A FALTA DE DEPENDÊNCIA DO DEUS INVISÍVEL – vv. 1-4
A primeira armadilha que é a causa da própria idolatria é destacada nos versos 1-4. Moisés havia subido ao monte Sinai para receber os mandamentos que Deus daria ao povo de Israel (24.12, 18). Lá se demorou com Deus 40 dias (24.18). O povo no meio do deserto, vendo que Moisés tardava em voltar, faz um pedido a Arão que ficara responsável por cuidar do povo enquanto Moisés estivesse no Monte diante da presença de Deus (24.14). Eles querem um deus que os guiasse em sua caminhada pelo deserto (v. 1). Mas qual o motivo? Deus não havia cuidado deles e os tirado do Egito? Por que, então, pedir para que Arão fizesse um deus? A razão é dada pelo próprio povo. Porque Moisés, o homem que os havia tirado do Egito, não aparecera e não sabiam o que se passara com ele. Perceba que a confiança quanto a libertação do Egito não estava posta sobre Deus, mas sim, sobre o homem que Deus usara para libertar o povo.

Várias vezes o livro de Êxodo apresenta o responsável pela libertação do povo da escravidão do Egito (Ex 12.42; 13.9, 16; 16.6; 20.2; 29.46). Sempre Deus é o Salvador. Aquele que tirou Seu povo escolhido do jugo da escravidão egípcia. Mas aqui Moisés é considerado pelo povo como o responsável e o fato de ele não estar presente levou-os a querer fazer deuses que pudessem ver e tocar assim como era visível a figura de Moisés.


Deus já havia dado o remédio para a idolatria em Êxodo 20.2, 3 e o povo havia se comprometido a obedecê-los (Ex 24.3). Ironicamente, os versos de 1-4 são o exemplo de como desobedecer exatamente os mandamentos que Deus havia estipulado para a nação israelita. Primeiro se esqueceram que Deus fora o responsável pela libertação, exatamente o que a introdução de Êxodo 20 (os dez mandamentos) faz questão de lembrar. Como conseqüência, desejaram ter outro deus que não o Senhor, o primeiro mandamento que está ligado à introdução. Deus como o libertador era o único digno de ser reconhecido como Deus, pois, agora, Israel pertencia exclusivamente a Ele e não mais ao Faraó.

E, então, fizeram uma imagem de escultura, algo que havia sido condenado no segundo mandamento. Pois Deus era esse Deus "absconditus" como chamava Martinho Lutero. Uma mistura de nuvem com coluna de fogo. Que se aproximou do povo no Monte de Sinai em uma mistura de trovão, raios, chamas de fogo, fumaça e um forte som de trombeta (Êx 19.16ss). Um Deus incomparável que imagem nenhuma poderia representar. Mas o povinho duro de coração (v. 9), ainda não aprendera com todas as experiências que haviam presenciado e fizeram uma imagem de um bezerro. Exatamente como haviam aprendido no Egito. O deus Ápis era representado por um bezerro e trazia a idéia de poder e fertilidade. O tempo no deserto ainda não fora suficiente para limpar a maldade do coração idólatra de Israel.

Mas, tudo começou quando deixaram de reconhecer o verdadeiro responsável pela libertação do povo. Quando atribuíram sua libertação não ao Deus invisível, mas ao Moisés que já não podia mais ser encontrado. Este estava, pelo menos, no mesmo nível de Deus dentro do pensamento do povo. Encaravam sua dependência como se encontrando em Moisés e por isso caminharam para a idolatria.

Conosco, hoje, esse mesmo processo acontece. Quando colocamos nossa dependência em objetos ou pessoas que não Deus, caminhamos para a idolatria. Queremos algo palpável. Deus parece "um ser distante", e por isso, é preferível e mais garantido confiar no que podemos tocar e ver. É mais fácil dizer:

· Foi o trabalho que me deu dinheiro até agora pra pagar a faculdade.
· É o trabalho que vai garantir meu futuro, esse negócio de Deus não dá estabilidade financeira pra ninguém. Por isso, não posso parar de trabalhar!
· É o meu namoro ou amizades que me dá (ão) alegria para viver.
· É o estudo da faculdade que garantirá o meu futuro!
· É minha família que me dá segurança e sustento, se alguém morrer não sei o que será de mim!
· Eu preciso correr atrás disso, desesperadamente, porque se eu não correr, não irei alcançar o que preciso.
· Eu preciso comer isso pra tranqüilizar minha ansiedade.


"Bênçãos de Deus podem se tornar em maldição quando passam a ser ídolos do nosso coração"


OBEDIÊNCIA AO ÍDOLO – vv. 5, 6
Já que o representante de Javé não se encontrava ali, então, o próprio bezerro passou a receber o nome de Deus. Mais um mandamento quebrado, agora o terceiro, "não tomará o nome do SENHOR – Javé - teu Deus em vão". Não bastava colocar sua dependência em alguém que não fosse Deus, agora, chamavam o próprio bezerro do nome que pertencia ao Senhor (v. 5). E isto, implicava não só em dependência do bezerro para guiar o povo (v. 1), mas também, em dispor seus corações em aliança com o bezerro. Agora, se colocavam em reverência ao bezerro para fazer a sua vontade e cultuá-lo em conformidade com culto que aprenderam no Egito. A conseqüência foi que como parte do culto (sacrifícios, comida e bebida) havia, também, uma verdadeira orgia. Um ritual sexual (v. 6). Eles, realmente, entregaram-se à farra como era costume nos cultos do Egito. Deus deixou de ser Senhor, o que Ele havia pedido para o povo já não importava mais. O que valia era curtir o momento. Satisfazer às paixões. Não havia mais absoluto, não havia mais pureza, não havia mais santidade (Êx 19.5, 6).

Sempre quando nós passamos a colocar qualquer pessoa ou objeto no lugar de Deus, a conseqüência é deixarmos de prestar reverência a Deus e passamos a prestar reverência e obediência ao ídolo.

Deixo de ter tempo com Deus (Mt 6.31) e com o povo de Deus (Hb 3.12, 13; 10.24) para dedicar tempo ao meu ídolo trabalho ou estudo, pois ele exige isso de mim. "O trabalho ou o estudo é o meu pastor e nada me faltará" .


Passo a ficar ansioso por algo e deixo de confiar em Deus. "Lancem as suas ansiedades sobre a comida ou sobre alguém que pode te ajudar e ela (e) cuidará de você".

Eu desonro a Deus no meu namoro e quebro princípios estabelecidos por Ele por amor à minha namorada ou ao meu namorado. "Como a corça suspira pelas águas, assim a minha alma suspira por meu namorado".

Eu passo mentir ou concordar com coisas erradas sem me posicionar porque se eu obedecer a Deus, vou perder o emprego ou amigos.

CONCLUSÃO
Nessa minha caminhada conhecendo o Aconselhamento Bíblico, aprendi com David Powlinson que uma das maneiras que Deus usa para livrar as pessoas do engano dos ídolos é zombar da insignificância desses ídolos. Isaías 44.9-20 estabelece esse tipo de situação. Hoje eu quero terminar zombando dos ídolos de nosso coração!!

A INSENSATEZ DA IDOLATRIA

Ai que tolo que fui! Coloquei minha esperança no trabalho,
achando que ele me daria segurança financeira e possibilidades de crescimento. Trabalhei, trabalhei e trabalhei até não poder mais,
até não ter tempo para Deus e Sua igreja.
Fiz vista grossa para com as desonestidades que aconteciam
porque afinal de contas: "O trabalho era meu pastor e nada me faltaria!"
Foi, então, que vi a besteira que fiz!
A empresa teve que fazer corte nos seus gastos e demitir funcionários
E aquilo que me dava segurança,
chutou meu traseiro e me deixou com a cara na rua!


Como sou estúpida! Achava que meu namorado era fonte de minha alegria e prazer
Fazia tudo por ele! Até o que não devia.
Dizia eu no meu coração: "A quem tenho nos céus senão a ti?
E na terra, nada mais desejo de estar junto a ti".
Tudo era maravilhoso até ele conhecer uma outra moça,
mais bonita, inteligente e simpática.
Todo o romance acabou e marcada eu fiquei
Fui mais uma das garotas "ingênuas" que ele enganou.

Como fui capaz disso! Achava que as formas daqueles corpos me dariam prazer
Revistas, filmes e mulheres que passavam pela rua,
Afinal, não prejudicava a ninguém.
Sempre pensava: "Playboy, tu és o meu Deus, eu te busco intensamente;
A minha alma tem sede de ti! Todo o meu ser anseia por ti,
numa terra seca, exausta e sem água".
Tudo parecia ir bem. Ninguém mais sabia.
Caminhava eu na estrada da destruição.
Destruí o relacionamento com minha esposa e filhos,
Perdi a honra e arruinei oportunidades de ministério.
É o que só podia se esperar quando desprezei a sabedoria e o ensino.

A Responsabilidade Pastoral

Ao desenvolver seu ministério, o pastor se depara com duas tarefas essenciais a executar. A primeira diz respeito ao seu estudo das Escrituras e a transmissão do conteúdo delas aos membros de sua igreja. Já a outra está ligada à prática pessoal dos princípios encontrados na Palavra de Deus e à condução do rebanho dentro de tais princípios, também. Como diria o ditado: "São dois lados de uma mesma moeda". Duas tarefas inseparáveis que sempre deverão andar juntas. O pastor não é um teórico acadêmico que deseja encher seus alunos de informação, sem, todavia, se preocupar com a maneira como aplicarão o que ensina. Nem é um pragmático que faz aquilo que dá certo ou que se está acostumado a fazer, sem avaliar se sua prática é coerente com o ensino da Bíblia. Mas o bispo é alguém comprometido em alimentar o rebanho com a verdade de Deus e conduzi-lo na vivência desta verdade (1 Tm 4.13-16; 2 Tm 4.1-2; Tt 1.9).

Em contraste com o trabalho pastoral, as ideologias erradas propagadas por aqueles que desejam se passar por mestres, conduzem os homens ao pecado (Tt 1.10-16). Ética e doutrina caminham juntas (2 Tm 4.3-4), daí a urgência do exercício da atividade pastoral na igreja do Senhor Jesus Cristo. Ele precisa corrigir o erro mediante o ensino daquilo que é digno de crédito ("Fiel é a Palavra") para que a conduta dos que foram confiados ao seu cuidado seja santa e sadia.
A LUZ NO FIM DO TÚNEL
Marcos 4.25-34

INTRODUÇÃO
Você já se encontrou decepcionado diante da falha de alguém que prometeu a você algo e não cumpriu? Já se sentiu frustrado por esperar que pessoas resolvessem o seu problema, mas isso não ocorreu?

Pessoas falham, e dificilmente poderão nos garantir algo. Lembro-me de quantas vezes, no ano passado, levei o meu computador para consertar numa empresa de informática perto de casa e quantas vezes fiquei decepcionado ao voltar e ver que o computador continuava com seus problemas. Lembro-me de quantas vezes liguei e falei com o administrador do local de minha igreja para consertar uma questão simples de luz, e quantas vezes falou que viria, sem cumprir sua promessa.

Pessoas falham, ninguém pode garantir algo com absoluta certeza. O Capitão do Titanic garantia que nem Deus poderia afundar o navio e o eleito Tancredo Neves, também, dizia que nem Ele o impediria de subir a rampa do palácio do planalto. Suas afirmações categóricas mostraram-se falhas.

A DESESPERANÇA HUMANA – vv. 25-26

No texto anterior de Marcos, vimos Jesus chegando de volta na Galiléia, provavelmente, na cidade de Cafarnaum, após uma viagem de barco. A multidão se aglutinou ao redor dele (5.21), em contraste ao local de onde ele vinha, na região de Gadara, em que o povo pediu para que ele os deixasse (5.17).

Jesus estava ainda na praia (v. 21), quando um homem vem correndo em sua direção, ajoelha-se e clama por ajuda. Era o líder de uma sinagoga, cuja filha se encontrava em estado terminal (vv. 22-23). Movido por compaixão, Jesus o acompanha até a sua casa. Neste ponto da história, deparamo-nos com os versos 25-26.

A multidão apertava Jesus, como sempre. No meio dela, o texto destaca uma mulher. Alguém em condição triste. Ela sofria de sangramento do útero ou de uma menstruação atípica. Isso era o suficiente para ser considerada impura cerimonialmente (Lv 15.25-27), sendo afastada da adoração comunitária no templo e do contato próximo com as pessoas, pois qualquer que a tocasse ou sentasse e deitasse em um lugar no qual ela estivera, anteriormente, seria impuro o restante do dia. Qualquer expressão de afeto com um ente querido, era acompanhado de um peso na consciência de que aquela pessoa se tornara impura por sua causa. Ela, tal como o leproso do capítulo 1, sofria os males sociais e de adoração que acompanhavam a sua doença, há doze anos!

Não podemos ignorar, também, que qualquer distúrbio físico era suficiente para receber acusações de pecado e relacionarem tal distúrbio com o castigo divino. Além do mais, o texto nos informa que ela sofrera debaixo do tratamento de vários médicos. Havia um ditado judeu que dizia: "A porta que não se abrir para dar esmola, se abrirá para o médico". O sofrimento, possivelmente, incluía ter que se expor perante estes homens e se submeter a tratamentos duros, sem a tecnologia de que dispomos.

Somado à dificuldade do tratamento, essa senhora gastara todo o seu dinheiro e posses na busca pela cura do seu problema, mas isso foi em vão. E, em lugar de experimentar alguma melhora, ela piorava ainda mais do seu problema. O texto deixa clara a total incapacidade humana frente ao problema. A mulher por si só não conseguia sair de sua situação e vários médicos com todos os seus conhecimentos e habilidades não puderam garantir uma cura para o seu estado que somente se degradava.

Assim como essa mulher, encontramo-nos diante de muitas situações em que pessoas serão incapazes de nos ajudar e até nos decepcionarem:

Aquela pessoa que garante nos arranjar um emprego melhor, falha.

A possibilidade de bolsa que tanto queríamos, não surge.

O apoio que esperava de minha família, não acontece.

Médicos falham ao não realizar seu trabalho da forma que deveriam e trazem complicações para a nossa saúde.

Um pai, mãe ou filho pode agir de um modo que nos entristeça e desaponte.

A CONFIANÇA NO PODER INCOMPARÁVEL DE JESUS – vv. 27-29

Diante da situação triste daquela mulher, uma pessoa aparece em sua vida. Ela ouve que Jesus estava por perto e vai ao seu encontro, se infiltra em meio à multidão e, por trás dele, toca em uma de suas vestes. Por que ela toca em uma de suas vestes? Porque entendia que por trás daquela roupa existia o único médico capaz de curá-la. Creio que não precisamos supor uma superstição da parte da mulher. O tocar na roupa era uma questão circunstancial. Esse tipo de situação é comum quando uma multidão cercava a Jesus (3.10; 6.56). Era difícil chegar em Jesus com tantas pessoas ao redor dele e, ainda, ela não queria se identificar por ser uma pessoa impura, a fim de não experimentar vergonha e humilhação diante dos outros.

Portanto, com sua fé no poder sobrenatural e salvador de Jesus, aquela mulher toca no manto dele e recebe a cura (v. 35). O que médico algum fora capaz de fazer até então, o Senhor Jesus o fez imediatamente. Ela se encontra curada daquilo que a afligia, antes.

Assim como essa mulher, precisamos aprender a colocar nossa dependência exclusiva em Jesus. Enquanto nossa confiança estiver posta em pessoas, sempre estaremos à mercê da desilusão, decepção, revolta.

Só Deus é capaz de firmar nossos passos e nos ensinar em meio às situações de crise. O Senhor Jesus pode usar pessoas para nos abençoar, mas em última análise, tal bênção procede dEle, não das pessoas. É preciso entender que nos momentos em que falharem conosco, o Senhor Jesus estará ao nosso lado para nos ajudar e podemos confiar na Sua soberania em todas as situações de nossa vida, até naquelas mais difíceis.

A BENÇÃO COMPASSIVA DE JESUS SOBRE AQUELES QUE CONFIAM NELE – vv. 30-34

A cura da mulher passou desapercebida de todos, mas, não de Jesus. Ele percebeu que de dentro dele saíra poder, não do seu manto. Jesus pergunta, então, à multidão sobre o toque no manto dele. Os discípulos, incapazes de perceber o que Jesus queria dizer com a pergunta, tratam Jesus como um bobo: "Como o senhor pergunta se alguém o tocou, se o senhor mesmo vê que tem um monte de gente à sua volta?". O texto de Lucas mostra Jesus explicando a razão da pergunta aos discípulos (8.46), ao passo que Marcos, simplesmente, diz que ele continuou a olhar ao redor, a fim de encontrar aquela que fizera isso.

Diante do interesse de Jesus pela identificação da mulher, ela, consciente de sua cura, aproxima-se dele e se prostra com temor e tremor. Mas não pára nisso, mas lhe conta toda a verdade. Toda a verdade acerca do que? De sua hemorragia, de seu sofrimento, de sua confiança na cura que apenas Jesus poderia oferecer e a bênção da cura que experimentara ao tocar em Jesus. Ela queria que tudo isso passasse desapercebido, mas Jesus entendeu que era importante a manifestação dela, pois o quebrantamento e reconhecimento da sua necessidade de salvação eram importantes. Isso fazia parte do processo de cura daquela mulher. Sem necessidade, não havia razão para a cura.

Quando ela lhe conta toda a verdade, Jesus declara que a sua fé a curou e que poderia ir para casa, em paz, curada de seu sofrimento. Jesus se compadece da situação miserável da mulher e responde à sua fé, garantindo a cura definitiva de sua doença.

Será que você reconhece a sua necessidade de Jesus, do cuidado e amor dele? Será que somos corajosos o suficiente para confessarmos que não somos nada e carecemos completamente da graça de Deus em nossas vidas. Quando há esse tipo de reconhecimento, não falta compaixão da parte do Senhor para conosco. É nos momentos que somos fracos que Ele diz: "a minha graça te basta".

Ele é sumo-sacerdote que se compadece em nossas fraquezas, quando por fé reconhecemos nossa dependência dEle para vencê-las.

domingo, 20 de janeiro de 2008

A GLÓRIA REVELADA AOS CEGOS
Marcos 6.45-52



INTRODUÇÃO
Conta-se a história de um jovem que fora visitar uma senhora de bastante idade, em seu bairro. O dia estava lindo, um céu azul, o sol raiando com todo o seu resplendor, as nuvens como flocos de neves, formando belas paisagens. Ao chegar na casa da mulher, o rapaz a viu sentada na varanda de sua casa. Como era a primeira vez que se encontravam, ele não sabia bem como entabular a conversa, então, após dizer “Oi!”, perguntou:

“A senhora não acha que está muito lindo o dia, hoje?”.

“Deve estar muito lindo, mesmo, meu filho, pena que sou cega e não posso enxergar como você”.

Apesar daquele dia maravilhoso, a cegueira da senhora a impedia de contemplar a glória do céu límpido e brilhante. Creio que há uma analogia muito forte com o incidente ocorrido em Marcos 6.45-52, em que a cegueira e insensibilidade dos doze discípulos, os impediu de contemplar a grandeza da revelação de Jesus, que se manifestava diante de seus próprios olhos.


DEUS REVELA SUA GLÓRIA A NÓS POR MEIO DE CRISTO

Após alimentar a multidão no deserto, Jesus apressa seus discípulos para entrarem no barco, em direção a Betsaida, a fim de o encontrarem lá, depois. Enquanto eles faziam esta viagem, Jesus despediria a multidão. Talvez, o motivo de Jesus “forçar” ou “pressionar” a que partissem logo dali, foi a situação descrita em João 6.14-15, na qual o povo queria fazer de Jesus rei, com uma perspectiva apenas sócio-política dele como Messias, não compreendendo sua missão espiritual que a precedia. Certamente, temos as réplicas modernas desse tipo de pensamento ao nosso redor.

Conseguindo se livrar das intenções precipitadas do povo, Jesus se retira para orar. São poucas as vezes que Marcos relata Jesus orando. Geralmente, esses momentos envolvem situações importantes em seu ministério. Na primeira ocasião, vimos Jesus orando após curar muitas pessoas em Cafarnaum, e no lugar de permanecer ali para satisfazer o afã do povo, decide se retirar para as cidades vizinhas, a fim de pregar o reino de Deus, já que este era o propósito principal de sua missão (Mc 1.35-39). O outro momento em que encontramos o Mestre em oração é no Getsêmani, pouco antes de ser preso, e ali se entrega para realizar a vontade do Pai, apesar do alto custo disso.

Aqui, não é diferente, depois de passar pela pressão e tentação satânica de tomar o poder do reino de Israel, sem passar pela cruz, Jesus investe tempo com o Pai, aquEle que o enviara para Sua missão.

Não posso deixar de destacar a importância que Jesus deu à oração em momentos de crise no seu ministério. Momentos em que os homens, carentes da visão de Deus, queriam desviar Jesus de Seu propósito. Ele passa tempo com o Pai, mesmo sendo Deus. Há um princípio didático aqui. Se queremos ter nosso ministério em alinhamento com aquilo que é a missão de Deus para nós, não podemos deixar de passar tempo com o Pai. A oração nos torna dependentes de Deus e nos instiga a fome por conhecê-lo e obedecê-lo. Quando nos preocupamos com tantas outras coisas e deixamos de buscar a Deus em oração, somos consumidos pelas exigências da tirania do urgente, em lugar de sermos dirigidos pela vontade do Pai.

A nossa preocupação está na prova da faculdade, no compromisso do serviço, em pagar as várias contas que temos, sair com os amigos, assistir o jogo de futebol, e acabamos por deixar de focar naquilo que deve orientar todas as nossas atividades, Deus e Sua vontade. Não evangelizamos mais, deixamos de nos importar genuinamente com aqueles que precisam da nossa atenção e amor, somos descompromissados com nossos compromissos na igreja local, porque a missão de Deus para nós perdeu lugar para aquilo que as pessoas e a correria dizem ser prioritário.

A noite vem, e os discípulos remam com muita dificuldade, devido ao vendaval no mar da Galiléia. Jesus está consciente da dificuldade dos discípulos e, várias horas depois, caminha sobre o mar na direção deles. Algo inacreditável! Assim como Jesus estava “sobre a terra” (lit. epi tēs gēs – v. 47), agora está “sobre o mar” (epi tēs thalássēs – v. 48). Jesus anda por onde apenas Deus pode caminhar (Jó 9.8; cf. Sl 77.19) e deseja passar pelos discípulos, assim como Deus passou perante Moisés e Elias revelando a Sua glória (Êx 33.19, 22; 1 Rs 19.11).Além de tudo isso, Jesus usa para si a expressão ego eimí, Eu Sou, ao tranqüilizar os discípulos, a mesma que Deus usou em Êx 3.14 ao se revelar a Moisés na sarça e que, freqüentemente, aparece no evangelho de João, com o propósito de revelar a natureza divina de Jesus. Se não bastasse todas essas demonstrações do auto-desvendamento do Deus-homem, o texto nos informa que quando Jesus entrou no barco, o vento se aquietou.

Não podemos nos esquecer, também, da revelação que recebemos de Deus por meio de Jesus Cristo. Todo aquele que vê o Filho, vê o Pai. Se queremos conhecer a Deus profundamente, precisamos nos aprofundar na revelação da Escrituras, porque elas que testificam de Cristo e Cristo nos torna conhecido o Pai. Nenhum crente irá crescer no conhecimento de Deus, se não investir tempo conhecendo o Cristo revelado nas Escrituras. Ler a Bíblia não ocupa um papel secundário em nosso dia, mas é essencial para conhecermos o Deus que nos ama.

A INSENSIBILIDADE ESPIRITUAL NOS IMPEDE DE CONTEMPLAR A GLÓRIA DE DEUS

Quanta demonstração da glória de Deus! Mas, também, quanta incredulidade humana. Os discípulos, com a alma insensível para a realidade da Pessoa de Jesus, gritam pensando que Ele é um fantasma, e ficam atônitos e maravilhados ao descobrirem que era Jesus quem andava por sobre as águas e, também, por verem Seu poder na calmaria que se fez. A razão de tudo isso era a dureza de seus corações para compreender a glória de Cristo evidenciada na multiplicação dos pães e, do mesmo modo, no seu caminhar por sobre as águas.

Provavelmente, por isso que Jesus precisou mandar seus discípulos para longe do povo, a fim de que não se fascinassem com a proposta de nomear Jesus como libertador político (Jo 16.14-15). Jesus é muito mais do que um grande libertador, Ele é o próprio Deus que se faz conhecido a nós na encarnação.

Em muitos momentos não somos diferentes dos discípulos em sua insensibilidade espiritual diante de Cristo. Olhamos para Jesus como um adesivo que colocamos atrás do carro ou como parte da mensagem que escrevemos ne frente de nosso nome no MSN, mas esquecemos de olhar para Cristo como o Deus Todo-Poderoso, que se revela a nós e deseja ser o Senhor de nossas vidas.

Nossas preocupações com aproveitar a vida e realizar nossos projetos e sonhos deixam Jesus de lado, nossas vidas já não são mais cristocêntricas, mas sim, egocêntricas. Estamos absorvidos por tantos anseios e pecados que fechamos nossos olhos para enxergar o Cristo revelado nas Escrituras.

É hora de refletir sobre aquilo que nos impede de ver a glória de Cristo clara e majestosamente manifestada nas Escrituras. Que anseios e preocupações tomam conta de nossos corações quando paramos para ler a Bíblia? Que atividades secundárias roubam o tempo da nossa devocional? Que pecados escondidos e guardados em nossa alma esfriam nosso desejo de nos encontrarmos com nosso Salvador?

Mantenhamos o nosso coração aquecido com a liberdade da ação do Espírito Santo em nossas vidas para contemplarmos, diariamente, a glória do nosso “grande Deus e Salvador, Jesus Cristo” (Tt 2.13).

sábado, 19 de janeiro de 2008

A Ética Cristã Numa Época de Relativismo Moral:
o problema da corrupção moral envolvendo evangélicos no contexto brasileiro

Após o famoso escândalo do “Mensalão” que mostrou próceres do governo e do Partido dos Trabalhadores (PT) oferecendo propina para que deputados apoiassem a coalização partidária de Lula, muitos brasileiros se encontraram estarrecidos e indignados com a proporção da corrupção que infestara o Congresso Nacional. A nação começou a se mobilizar com mais intensidade contra estes abusos de poder e evangélicos tomaram maior consciência de seu papel importantíssimo na sociedade da qual faz parte. Protestos mediante vários meios ocorreram com o fim de cobrar a integridade dos parlamentares brasileiros.

Pouco tempo depois, mais um escândalo de corrupção nacional fora descoberto. Membros da Câmara e Senado prejudicaram o orçamento nacional devido ao esquema de compra de ambulâncias e UTIs móveis superfaturadas. O pior é que quase metade da Frente Parlamentar Evangélica se encontrara na lista dos investigados. Curiosamente, a denominação cujo número de deputados envolvidos no escândalo foi maior, costuma pregar o evangelho da fé que se preocupa, essencialmente, em alcançar bênçãos materiais. Isto nos ajuda, de certa forma, na busca da solução para o terrível problema de muitos evangélicos encontrados no meio da pilantragem nacional.

O primeiro problema a ser destacado, portanto, é a ênfase na busca pelo dinheiro, antes que por uma ética poderosamente capaz de transformar nossa sociedade. Em sua Primeira Carta a Timóteo, Paulo advertira ao jovem pastor sobre o perigo de homens que ensinavam doutrinas contrárias ao evangelho (1 Tm 6.3-10). O propósito desses homens era usar a piedade como fonte de lucro, indicando a coerência entre o ensino falso, promovido por pessoas orgulhosas, e o uso da fé para alcançar riquezas. A conseqüência inevitável de pessoas assim, seria a queda em armadilhas, desejos descontrolados e perigosos, que, por sua vez, os conduziria à ruína e destruição. Assim, o apóstolo concluiria: “Pois o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males” (1 Tm 6.10, NVI). Um quadro por demais semelhante com o contexto presente.

A solução para o dilema, então, é buscar o verdadeiro evangelho e a real piedade que entende a nossa breve passagem neste mundo, para onde nada trouxemos nem dele levaremos qualquer coisa (1 Tm 6.6-8). É necessário pregar evangelho da cruz no lugar do “evangelho” da glória do homem, apelidado por Martinho Lutero de “Teologia Porca”. Mesmo preservando o sentido do uso deste termo em seu contexto, a ênfase antropológica, antes que teológica, continua a mesma, infelizmente, no kerigma popular de nossa época. Urge lembrar, em nossos dias, que a fé produz obras e não dólares (Tg 2.14-26), e as bênçãos espirituais já recebidas em Cristo são, essencialmente, de natureza espiritual (Ef 1.3-14).

No sermão do monte quando Jesus ensinou seus discípulos a viverem como comunidade do reino e, assim, serem “sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 5.14-16), não estava preocupado em que os crentes espalhassem pelo mundo técnicas sobre como ganhar dinheiro ou alcançar o lucro, mas de viverem uma ética que ultrapassava a conhecida em sua época (5.20), levando os homens a contemplarem a justiça de Deus e a reconhecerem, dando glórias a Ele (5.16). Assim, também, aqueles que exercem a liderança política nacional e afirmam experimentarem um relacionamento real com Cristo e serem parte de Sua igreja, precisam lembrar de seu papel importante de testemunharem a justiça de Cristo para o mundo em seu redor e produzirem, então, transformação na ética política deste país.

Outro princípio a ser lembrado aos representantes evangélicos no governo é o da responsabilidade que as Escrituras atribuem àqueles que se encontram no poder de uma nação. Precisam conhecer profundamente a lei de Deus e não se considerarem superiores aos demais, usurpando de privilégios que não lhes compete (Dt 17.18-20). A crítica do profeta Isaías aos governantes de Judá era a sua falta de compromisso com a justiça social, deixando de defender e se preocupar com os menos favorecidos do povo e, no lugar disso, prejudicavam os pobres por aceitarem o suborno na hora de julgar (Is 1.10, 17, 23).

Por fim, a consciência do cristão de que sua posição de autoridade, seja legislativa, executiva ou judiciária, é dada por Deus, deve, inevitavelmente, conduzi-lo ao compromisso com a ética cristã e busca pelo bem da comunidade acima de seus próprios interesses (Rm 13.1-4). É nada mais que cumprir o segundo maior mandamento, reflexo da realização do maior, pois o amor ao Deus justo implica em ser justo no amor dispensado ao próximo.
NOSSA HERANÇA REFORMADA
Resgatando Verdades na História

INTRODUÇÃO
Em 31 de Outubro, de 2007, a reforma protestante comemorou seus 490 anos, desde que um doutor, professor e pregador decidiu afixar suas 95 teses na igreja do castelo de Wittenberg. O nome dele? Martinho Lutero. A revolução apenas iniciada por essas teses, foi originada numa situação de degradação do maior poder religioso de sua época, a Igreja Católica Romana. Vários fatores contribuíram para o desencadeamento da reforma que Lutero propôs.
Primeiro, é importante lembrar que a reforma não nasceu com Lutero, na verdade, outros homens como John Wycliffe, John Hus, os valdenses, entre tantos, expressaram sua indignação diante da falência espiritual na vida religiosa de sua época. Uma quebra com o sistema segundo o qual funcionava a Igreja e um retorno à estima e consideração pela Bíblia como Palavra de Deus marcaram estes movimentos.

Aliás, a Bíblia foi um elemento determinante para o começo da reforma, desde que Lutero ousou questionar certas estruturas enquanto estudava as cartas do apóstolo Paulo, encontradas na Bíblia. Daí conceitos como Sola Scriptura, reconhecendo a Bíblia como autoridade máxima na vida da igreja e não o papa, nem a tradição. Dentro disso, também, vieram conceitos como sola gratia, sola fide e Solus Christus, quando, estudando a carta aos Romanos, Lutero descobriu a verdade de que “o justo viverá pela fé” (Rm 1.17), a qual é depositada na graça de Deus oferecida com base na obra de Jesus Cristo. Sendo assim, as famosas indulgências vendidas pela igreja de Roma, que prometiam a salvação eterna, eram uma contradição do evangelho encontrado nas Escrituras.

O ambiente da vida religiosa era terrível, as guerras promovidas pelos papas, excomungando reis que não quisessem se submeter a eles, filhos de nobres recebendo cargos na igreja, simplesmente pela riqueza e prestígio da família, e o comércio das prostitutas nas igrejas e em locais de peregrinação em Roma. Tudo isso deixava claro que a igreja nada mais era do que um comércio e uma fachada sacra que escondia a luta pelo poder, prestígio e riqueza de homens contaminados pela perversidade.

Ao observar este contexto, não posso evitar compará-lo com a situação religiosa evangélica de hoje e buscar resgatar princípios legados pelos reformadores. Cabe aqui lembrar que, assim como a reforma não começou com Lutero, também, não terminou com ele, pois, homens como João Calvino, Ulrich Zwinglio, John Knox, entre outros, deram continuidade importante e definiram melhor certas questões. Portanto, quando falo de princípios legados pelos reformadores, não me limito a Lutero, mas, o incluo como parte do todo.

Diante dessa introdução, passo a destacar duas verdades legadas pela reforma, fundamentadas no Sola Scriptura, que são, por demais, pertinentes para os nossos dias.

1. TEOLOGIA DA CRUZ
Por que a primeira verdade que desejo destacar é esta? Simplesmente, porque passamos por uma verdadeira crise, a igreja evangélica de hoje tem perdido esta perspectiva que Lutero tanto enfatizou sobre uma teologia centrada na cruz, onde o homem conhece a Deus por meio do escândalo da cruz e não por seus próprios méritos (1 Co 1.18-25). Enquanto tal teologia buscava conhecer a Deus desta forma, o outro modo, pelo qual os teólogos da época buscavam conhecer a Deus, foi denominado por ele como teologia da glória, na qual a razão tinha a primazia e se buscava chegar até Deus por meio dela.

Esse movimento ficou conhecido na história como escolasticismo, período em que a filosofia de Aristóteles dominou a teologia, e se exigia que aqueles que pretendessem trabalhar neste campo, obtivessem um adequado conhecimento da filosofia aristotélica. O que acontecia era que a revelação de Deus, encontrada na Bíblia, ficava de lado e não recebia a importância que merecia. Diante disso, o homem buscava fazer seus próprios caminhos para alcançar Deus, no lugar de aceitar a revelação suprema em Jesus e Sua obra. Assim, o homem criou um Deus à sua imagem.
Lutero passou a denominar como teologia da glória qualquer teologia contrária àquela proclamada no evangelho. O papismo e suas indulgências, também, foram alvos de suas críticas por depreciar a cruz de Cristo. As crendices em relíquias religiosas eram rejeitadas, da mesma forma, pelo teólogo alemão.

Penso em como isso afeta a nossa teologia, hoje. É muito comum ver a ênfase moderna evangélica cada vez mais no homem e menos em Deus. Tem-se enfatizado muito certos mediadores e seus poderes. São os apóstolos, bispos e missionários, cuja oração e interpretação da Bíblia possuem um poder superior às dos outros. Se você colocar a mão sobre seu problema físico, enquanto o missionário orar, ele já não mais existirá. Se você, receber a água do rio Jordão (que, aliás, vem num copinho embalado) ou a rosa consagrada, então você prosperará. Tudo isso são maneiras humanas de se achegar a Deus, no lugar de buscar conhecê-lo por meio da revelação dEle nas Escrituras. Não basta a mensagem do evangelho, é preciso que se acrescente algo mais a ela.

O mercado religioso que temos visto, hoje, não é muito diferente do mercado religioso da época de Lutero, em que as indulgências da época eram condição para a salvação. Hoje, para Deus abençoá-lo, é necessário dar e dar, a fim de que Deus o recompense. Se você quer prosperidade, cura, sucesso nos relacionamentos afetivos, você precisa dar o trízimo (o dízimo de cada Pessoa da Trindade!), para barganhar com Deus os seus desejos. Isso não é teologia da glória? O homem tentando alcançar as bênçãos com o seu próprio dinheiro. Deus deixou de nos abençoar por pura graça, agora Ele abençoa porque precisa de uns trocados nossos para realizar o trabalho dEle.

2. A CONDIÇÃO DECAÍDA DO HOMEM
Ao entender que a salvação humana deveria ser alcançada pelo próprio indivíduo, em cooperação com Deus, a teologia católica medieval (que, diga-se de passagem, não difere em essência do que é hoje) tinha como ponto de partida uma visão otimista do homem, diferente daquela encontrada nos reformadores. Essa visão católica ficou conhecida como semi-pelagianismo ou sinergismo e desconsiderava o fato, desde o princípio exposto nas Escrituras, de que o homem é totalmente depravado e completamente incapaz de se achegar a Deus por si mesmo.

Foi contra essa alta estima da condição humana que os reformadores se levantaram. Lutero entendia, baseado em Romanos 1, que, devido ao pecado, o homem rejeita a adoração verdadeira a Deus em favor de ídolos. Foi de João Calvino a famosa frase que definia o coração humano como uma fábrica perpétua de ídolos. “O homem inteiro, em si mesmo, nada mais é do que concupiscência”[1].

Para João Calvino, o pensamento de que o homem era bom, excelente e capaz era expressão de um “cego amor próprio” perigoso. Devíamos começar com a perspectiva da nossa nobreza original e como ela foi perdida com a queda. Ao ver nossa condição anterior e nossa condição presente, entendemos a grandeza de nossa miséria e ansiamos pela dignidade de outrora. David Engelsma captou bem a perspectiva de João Calvino ao intitular seu artigo Apenas um asqueroso mau cheiro: a doutrina de Calvino acerca a condição espiritual do homem caído[2].

Agora, tudo isso não deve nos levar a uma conformação com esse estado de total depravação, “mas assim, tendo completo conhecimento de nossa miséria, podemos ser levados a Cristo, que é enviado para ser um médico aos doentes, um libertador aos cativos, um confortador aos aflitos, um defensor aos oprimidos (Is 61.1)”[3]. Cristo, então, passa a ser a única solução para o homem, tanto para a sua justificação quanto para uma vida corretamente direcionada na adoração do único Deus.

Precisamos resgatar as verdades do pecado original e depravação total que nos levam a depender exclusivamente de Cristo e enxergar as anomalias da alma humana como resultado de um coração pecador, não como um distúrbio psíquico ou meramente como fruto de causas orgânicas. Jay Adams e todos aqueles que deram continuidade ao seu trabalho vêm resgatando essa verdade da pecaminosidade humana, no aconselhamento bíblico. John MacArthur nos lembra da incompatibilidade entre a psicologia secular e a visão reformada e bíblica da pecaminosidade humana[4].

Creio, sinceramente, que resgatar a perspectiva correta da condição decaída do homem trazida pela reforma, é retornar a um aconselhamento que leva a sério o pecado. Nas comunicações de uma semana de estudos, de uma determinada faculdade teológica, ouvi um professor dizer que no processo de disciplina em sua igreja, com uma pessoa que estava sendo tratada por causa de roubo, ao invés de confrontarem o pecador em seus erros, o levaram para um tratamento psicológico, já que fora diagnosticada como cleptomaníaca.

Francamente, isto não é levar o pecado a sério como a Bíblia mostra nem como os reformadores entenderam. Esse tipo de teologia que se vende ao papismo da psicologia secular não é teologia reformada, muito menos bíblica. Urge resgatarmos tanto teoricamente, como de forma prática, o entendimento de que somos simul justus et peccator, que, ainda que considerados justos perante Deus e, regenerados pelo Espírito Santo, temos uma natureza pecaminosa que precisamos fazer morrer, diariamente (Rm 8.13; Cl 3.5). É esse entendimento reformado do homem, que os puritanos, mais à frente, desenvolveram de modo muito perspicaz, e que necessitamos resgatar como evangélicos protestantes, hoje.

Precisamos parar de rotular pessoas como “cleptomaníacas”, “bipolares”, “anorexas”, “portadores de transtornos obsessivo-compulsivos”, etc, levando-as à prostituta diabólica da razão psicológica[5] para resolverem seus problemas. Ao contrário, devemos confrontar o pecador com seu pecado e maldade, conduzindo-o à Cristo e Sua obra, como o único remédio para a sua restauração conforme a imagem do Criador (Ef 2.22-24; Cl 3.9-10). Cristo e as Escrituras sempre serão suficientes para transformar nossa condição miserável decaída.

CONCLUSÃO
Espero, neste estudo, ter promovido uma reflexão do princípio “reformado sempre reformando”, pois, necessitamos, continuamente, avaliar nossa teologia e práxis cristã, à luz das Escrituras e retornar aos pontos fundamentais de nossa fé.

A cruz de Cristo deve ser resgatada e suas implicações tanto no nosso entendimento da salvação, suas bênçãos e da vida de discipulado. Negando nos prostrar diante dos super-homens, e “aceitar a Cristo ... conhecê-lo como um dom e favor” que nos foi dado e nos pertence, de tal maneira que, quando o vemos ou o escutamos o que Ele faz ou sofre, não devemos duvidar de que Ele mesmo, Cristo, com tal obra e sofrimento seja nosso[6].

Por fim, nossa pecaminosidade nunca deve ser desprezada nem ignorada, porque, fazendo isso, desprezaríamos a Pessoa de Cristo e Sua obra em nosso favor. “... para receber as bênçãos de Deus nenhuns se admitem, senão os que do senso de sua pobreza se consomem”[7].

[1] Calvino, João apud George, Timothy. Teologia dos reformadores. p. 214.
[2] ENGELSMA, David. “Nothing but a Loathsome Stench”: Calvin’s Doctrine of the Spiritual Condition of Fallen Man. In: Protestant Reformed Theological Journal, April 2002.
[3] CALVINO, João Apud ENGELSMA, David. “Nothing but a Loathsome Stench”: Calvin’s Doctrine of the Spiritual Condition of Fallen Man. In: Protestant Reformed Theological Journal, April 2002.
[4] Ver MACK, Wayne, JÚNIOR, John MacArthur. Introdução ao Aconselhamento Bíblico. p. 26-27, 123-141.
[5] Encontro minha inspiração em Lutero quando uso este termo, especialmente quando ele abordava a questão da filosofia aristotélica.
[6] LUTERO, Martinho. Comentarios de Martín Lutero: Primera y Segunda de Pedro, Judas y Primera de Juan. p. 12.
[7] Calvino, João apud George, Timothy. Teologia dos reformadores. p. 215.

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