sábado, 26 de setembro de 2009

JESUS: FILHO OU SENHOR DE DAVI?

Marcos 12.35-37


"Ensinando no templo, Jesus perguntou: 'Como os mestres da lei dizem que o Cristo é filho de Davi? O próprio Davi, falando pelo Espírito Santo, disse:

"O Senhor disse ao meu Senhor:
Senta-te à minha direita
até que eu ponha os teus inimigos debaixo de teus pés".

O próprio Davi o chama "Senhor". Como pode, então, ser ele seu filho?'. E a grande multidão o ouvia com prazer."


No texto anterior, Marcos narrou o encontro de Jesus com um mestre da lei sedento pela verdade e sensível ao ensino de Jesus. Agora, o Senhor questiona a forma como os mestres da lei lidavam com as Escrituras e sua visão distorcida sobre o Messias. A temática do “Filho de Davi” (um termo messiânico) não aparece fora de lugar em Marcos. Já durante a peregrinação, um cego, próximo à saída de Jericó, havia reconhecido Jesus como o “Filho de Davi” e rogava por sua compaixão (10.46-48). Além disso, a multidão de peregrinos saudou Jesus na entrada de Jerusalém: “Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o reino que vem, o reino de Davi, nosso pai! Hosana, nas maiores alturas!” (11.9-10).

Desde 8.27ss, o mestre vem trabalhando com os seus discípulos acerca da tarefa sacrificial do messias e uma visão mais ampla de sua pessoa e obra. Aqui ele rebate um conceito político e nacionalista judeu que limitava o Messias às mesmas funções de Davi e de um governo focado em Israel. Uma passagem judaica antiga definia o filho de Davi como “aquele que despedaça os pecadores como potes de barro” (Salmos de Salomão), em referência aos romanos. Conforme o Antigo Testamento, não é errado pensar no Messias, o futuro rei e salvador de Israel, como o filho de Davi, desde que várias passagens do AT indicam isso (cf. Is 9.2-7; 11.1-9; Jr 23.5-6; Ez 34.23-24; Am 9.11). O grande problema era limitá-lo dentro da obra e identidade do antigo rei Davi. Por isso, Jesus cita o Salmo 110.1, um texto que, muito provavelmente, era reconhecido como messiânico em sua época.

Duas observações importantes iniciais que Jesus faz do Salmo é que ele foi proferido por Davi e que ele disse isso guiado pelo Espírito Santo, uma afirmação comum rabínica para descrever um texto divinamente inspirado. Deste modo, o conteúdo dele era de grande valor e provia fundamento para o argumento de Jesus. No salmo, Davi contempla Deus (Yahweh) dialogando com um rei humano, o qual chama de “meu senhor” (’adonî). O contexto do Salmo 110 indica que esse senhor é um descendente de Davi, já que o seu cetro de poder flui de Sião e ele age como co-regente de Yahweh (Sl 110.2, 5-6; cf. 2 Sm 7.12-16). Assim, a conclusão que Jesus chega é que Davi chama de “senhor” um descendente seu que só pode ser o messias esperado e glorioso. E, se o messias é superior a Davi, isso implica em superioridade como pessoa e em obras.

A implicação clara para o momento é que, se Jesus é claramente o Filho de Davi, aguardado pelo povo, então, os líderes religiosos judaicos tinham diante de si alguém que era superior a Davi, pois era o próprio filho de Deus (1.11; 9.7), e cuja obra superava os feitos de Davi, tanto no escopo espiritual, pois seria capaz de oferecer salvação para muitos (10.45 – uma clara indicação de sacrifício salvífico universal, não apenas aos judeus; cf. 8.31; 10.33-34), e no que tange ao governo universal, já que seu trono se encontra à direita de Deus, não simplesmente em Jerusalém (veja a aplicação dada por Pedro em Atos 2.32-36).

Assim, quando a liderança judaica se opunha a Jesus, se opunha a alguém cuja autoridade deveria fazê-los se curvar, por ser o Rei do universo e maior que Davi; posição esta vindicada por sua ressurreição (Mt 28.18; At 2.32-36; Rm 1.3-4). E rejeitá-lo era negar o único meio de salvação oferecido por Deus a todos, judeus e gentios (cf. 10.45).

Precisamos avaliar de que modo nossa perspectiva acerca de Jesus pode se encontrar, também, distorcida como os judeus daquela época. Talvez, não duvidemos do poder de Jesus, mas muitas vezes o colocamos dentro de pacotes fechados conforme os nossos interesses. Hoje em dia, muitos têm feito de Jesus um milagreiro ou um gênio da lâmpada mágica que existe para acabar com os seus sofrimentos físicos ou lhes dar tudo o que desejam.

Já outros pensam nele como o Senhor de suas vidas apenas nos aspectos religiosos, nunca transformando sua moral nem conduzindo suas decisões. Apenas vão à igreja, cumprem seu tempo devocional com certa dificuldade e acham que, fazendo isso, já estão levando a sério o senhorio de Cristo, sem se preocuparem como seus ensinos e palavras afetam seus relacionamentos com as pessoas ao redor, sua conduta no trabalho, sua vida particular ou familiar.

De que modo as palavras de Cristo como o mandato de “fazermos discípulos” são encaradas por nós? Como as palavras daquele que tem autoridade sobre céus e terra (Mt 28.18-20)? Será que realizamos muitos serviços em nome de Jesus ou cantamos músicas que proclamam o seu senhorio, mas somos resistentes em obedecer sua Palavra (Mt 7.21-23)? Quem dirige a nossa vida dentro da competitividade do mercado, Deus ou Mamom (Mt 6.22-24)? Estamos dispostos a ter Jesus como o Rei de nosso viver, mesmo que isso traga oposição e, até mesmo, o ódio de nossos familiares (Mt 10.34-38)?

Estamos tão suscetíveis a amoldar Jesus aos nossos interesses e perspectivas como os mestres da lei da época de Cristo faziam com o “filho de Davi” e, assim, corremos o risco de deixar de servir o Jesus das Escrituras para servir aos nossos próprios desejos mesquinhos e mundanos.

sábado, 12 de setembro de 2009

PURIFICAÇÃO: Uma Oração Puritana


Senhor Jesus, eu tenho pecado.

Permita que eu nunca venha a cessar de me angustiar por isso,

Nunca esteja satisfeito comigo mesmo, nem pense que alcancei o ponto da perfeição.

Mata a minha inveja, controle a minha língua, esmague o meu eu.

Dê-me a graça para ser santo, compassivo, gentil, puro, pacífico

Para viver para Ti e não para mim,

Para imitar tuas palavras, atos, espírito, ser transformado à Tua semelhança,

Ser consagrado completamente a Ti e viver completamente para a Tua glória.



Liberta-me do apego à coisas impuras, das companhias erradas,

Do predomínio das paixões más,

Da adulação do pecado bem como de seu abismo.

Que com uma auto-aversão, profunda contrição, uma busca intensa de coração

Eu venha a Ti, lance-me sobre Ti, confie em Ti, seja liberto por Ti.

Ó Deus, Sempre Eterno,

ajuda-me a perceber que todas as coisas são sombras, mas Tu és a substância,

Todas as coisas são como a areia movediça, mas Tu és a montanha,

Todas as coisas são móveis, porém, Tu és a âncora,

Todas as coisas são ignorância, porém, Tu, a sabedoria.



Se minha vida deve ser um crisol em meio ao calor abrasador, que assim seja,

Mas assenta-Te próximo à fornalha, a fim de que observes o ouro,

Para que nada seja perdido.

Se eu tenho pecado obstinadamente, aflitivamente, angustiosamente,

Em graça, arranque meu choro e dê-me música;

Remove as minhas vestes de saco e vista-me com a beleza;

Acalma meus suspiros e enche minha boca com um cântico,

Então, concede-me o verão de um cristão.



Tradução:
Tiago Abdalla

Fonte: Arthur Bennett (ed.). “Purification”. In: The Valley of Vision: A Collection of Puritan Prayers & Devotions.

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