domingo, 27 de abril de 2008

A Humilde Confiança no Poder de Jesus

A HUMILDE CONFIANÇA NO PODER DE JESUS
Marcos 7.24-30

INTRODUÇÃO

Quando criança, ouvia no rádio do carro algumas pregações, em que um certo pastor ensinava que como filhos do rei, devíamos exigir o melhor para nossa vida. Não poderíamos concordar com algo que não nos agradasse, temos o direito de ter tudo o que queremos.

Por outro lado, às vezes, via na televisão, um missionário, mandando que disséssemos ao diabo para sair de nossa vida quando qualquer coisa ruim acontecesse conosco. Deveríamos falar: “Diabo! Em o nome de Jesus eu não aceito isso que você traz para a minha vida! Saia agora!”.

Essas teologias refletem perspectivas de Deus distorcidas e esquizofrênicas. Uma trata Deus como se fosse nosso servo que deve satisfazer todos os nossos desejos, a outra como se o Diabo tivesse um poder quase igual ao de Deus e nós estivéssemos a mercê do poder dele em todo o momento, precisando repreendê-lo e lutar contra ele, já que Deus não consegue dar conta sozinho.

Hoje, quero propor um retorno àquilo que temos estudado em Marcos, especialmente para a história de uma mulher que nos ensina sobre como nos relacionarmos com Cristo e com Deus. Ela quebra essas duas idéias acima, porque ela se achega diante de Jesus, com um pedido, de forma humilde, reconhecendo o Senhorio dEle. E, também, porque não se preocupa em discutir com o Diabo, mas clama àquEle que está acima de qualquer poder. Vamos ler e refletir sobre Marcos 7.24-30.

A EXPRESSÃO DE CONFIANÇA E DEPENDÊNCIA DE CRISTO – vv. 24-26

Antes de chegarmos neste texto, encontramos no contexto um debate de Jesus com a liderança religiosa, acerca da pureza cerimonial da tradição judaica. O tradicionalismo seguido pelos fariseus os atrapalhava e impedia de obedecerem completamente à Lei. Essa foi a crítica de Jesus a eles. Após esse entrave, Jesus contou uma parábola à multidão, e a explicou aos seus discípulos. O princípio que destacou foi a neutralidade dos alimentos para a nossa espiritualidade. O que contamina o homem espiritualmente não são os alimentos, mas sim, o seu coração que é naturalmente inclinado para o mal.

Como conseqüência do ensino de Jesus sobre a indiferença da pureza cerimonial, agora, Ele quebra mais um paradigma judaico, indo para uma região de gentios, próximo à cidade de Tiro. É de se notar, também, que a continuidade do ministério público de Jesus se tornava mais tensa, especialmente pela oposição daqueles que lideravam os judeus. É comum depois de alguns entraves, Jesus se retirar dos centros urbanos, a fim de preservar sua pessoa e ministério, como faz aqui (cf. Mc 2.13; 3.7).

Enquanto no meio judeu, os corações demonstram sua dureza para crer em Jesus, entre os gentios, acha-se um solo fértil de corações quebrantados e confiantes na Sua graça.

O propósito de Jesus era ter um tempo a sós com seus discípulos, não objetivava qualquer sucesso no exterior. Daqui em diante, veremos uma dedicação maior de Jesus especificamente para com o grupo dos doze, instruindo e lhes explicando acerca de Sua missão. Por isso, o verso 24 nos diz que Ele não queria que ninguém soubesse de sua presença ali.

Todavia, ele não conseguiu manter-se no anonimato, uma mulher, cuja filhinha sofria de possessão demoníaca, ficou sabendo que Jesus estava por ali. A expressão “espírito imundo” é um característico idiomatismo judaico, que mais à frente será identificado como demônio. Ouvindo as boas novas, a mulher correu na direção e se prostrou aos seus pés em atitude de reverência e dependência.

Marcos lembra que a mulher era grega, ou seja, não judia, pagã e, por isso, considerada impura pelos judeus. Aqui há um link muito forte com o contexto que precede. Se não há alimento puro ou impuro, também não existem pessoas puras e impuras. Todas são iguais perante Deus e completamente carentes de sua graça.

Um rabino que viveu cerca de 150 d.C. ensinou que se deveria agradecer a Deus todos os dias: “Louvado seja Deus porque não me criou pagão! Louvado seja Deus porque não me criou mulher! Louvado seja Deus porque não me criou ignorante!”. Essa mãe se encaixava totalmente dentro da oração. Um judeu considerava a casa de um pagão, impura e as refeições, também, de modo que quando participava das refeições com pagãos, trazia comida de casa. Deveria se evitar uma conversa com um pagão, pois a saliva deste podia atingir o judeu. A descrição no verso 25 coloca a mulher numa posição nada favorável diante da religiosidade judaica e, certamente, é um contraste marcante com os líderes religiosos que aprecem no começo do capítulo 7.

Ao contrário dos fariseus e escribas que se aproximam de Jesus para julgá-lo, esta mulher se humilha diante dEle e clama, insistentemente (ênfase do verbo grego no imperfeito), para que libertasse sua criança do demônio que a possuía.
O exemplo de dependência e reverência desta mulher, sem dúvida, nos ensina como nos aproximar de nosso Salvador. Nosso relacionamento com Cristo nunca deve ser uma questão secundária em nossa vida, mas sim, uma relação com aquEle de quem dependemos e precisamos, constantemente, em nosso viver. Sem Cristo nada somos.

É diante dessa realidade que o autor de Hebreus podia afirmar que é Ele quem sustenta todas as coisas com a Sua palavra poderosa (Hb 1.3). Ele é o Criador de tudo e sem Ele, nada do que foi feito existiria (Jo 1.3). É graças a Ele que podemos, hoje, ter vida eterna com Deus (Jo 3.16). Aliás, vida eterna nada mais é que relacionamento com o Pai e com o Filho (17.3), comunhão profunda com o Deus Triúno.

Como você se achega diante de Jesus? Como o servo que deve satisfazer seus desejos pessoais, dar o namorado que você quer, conceder um cargo melhor na empresa que você deseja, melhorar sua condição financeira? Será que Jesus é visto assim por nós? O que ocorre quando as coisas não acontecem do nosso jeito e no nosso tempo? Ficamos murmurando e reclamando? Vemos nossa relação com Cristo com uma atitude de utilitarismo? Se as coisas estão mal, então, buscamos a Ele e se não responde aquilo que queremos, da forma que desejamos, então, viramos as costas para Ele e deixamos o relacionamento com Cristo de lado. Infelizmente essa é a espiritualidade de muitos crentes.

A PRIORIDADE MINISTERIAL DEFINIDA POR CRISTO – v. 27

Jesus, então, explica por meio de uma parábola que sua prioridade ministerial era com o povo judeu e não com os gentios (Mt 15.24ss; cf. 10.5-7). O termo filho fora usado no Antigo Testamento para indicar o povo de Israel (Êx 4.22-23; Dt 14.1-2; Jr 3.19, 22; 31.9) e Jesus usa a mesma idéia aqui. Já os pagãos eram chamados pelos judeus de cães. De forma carinhosa, Jesus compara a mulher pagã com os kinarioi que não eram cães de rua, mas sim, os cachorrinhos domésticos que eram cuidados por uma família. O princípio no texto não é de superioridade, mas sim, de prioridade, assim como na casa, primeiro as pessoas eram alimentadas, para, depois, os animais receberem o seu alimento. Da mesma forma, primeiro, os judeus deveriam se saciar com as bênçãos de Deus, então, os gentios receberiam a sua parte.

Jesus, aqui, demonstra fidelidade à missão que Seu Pai lhe dera. Não quer permitir que a rejeição por parte dos judeus, o leve à busca do glamour em meios aos gentios. A ordem de prioridade é bem evidente nos evangelhos, em que a rejeição dos judeus legitimou a missão aos gentios (cf. Mt 10.5-7 com 28.18-20).

Assim, hoje, podemos louvar a Deus, porque “por causa da transgressão deles, veio salvação para os gentios” (Rm 11.11). Mas sabemos, também, que um dia virá quando “todo o Israel será salvo” (Rm 11.26), e a graça de Deus será evidente (Rm 11.30-32).

O PODER COMPASSIVO DE CRISTO DIANTE DA SÚPLICA HUMILDE E INSISTENTE – vv. 28-30

A mulher, de forma humilde, reconhece Jesus como “Senhor”. A única vez que o termo ocorre no evangelho de Marcos, quando alguém se dirige a Jesus, e implica no reconhecimento da autoridade de Jesus e sua posição de superioridade para fazer o que lhe apraz. Todavia, ela faz uso da mesma ilustração, para insistir no seu pedido a Jesus. Era comum, depois de comerem o alimento com as mãos, no oriente antigo, as pessoas quebrarem pedaços de pão, para enxugar os dedos melecados e grudentos. Assim, caiam farelos na mesa que eram jogados no chão e, então, os cachorrinhos comiam, mas só depois e que eram alimentados. Aqui a mulher encontra uma analogia para suplicar as migalhas da bênção de Deus que caíam da mesa dos judeus.

O que me surpreende é que ela não corrige Jesus, não vai embora depois de ser comparada com um cachorrinho, pelo contrário, é nesse momento que a fé dela se evidencia (Mt 15.28), reconhecendo o senhorio de Jesus e clamando, de modo humilde e insistente, pela libertação de sua filha àquEle que trazia o reino de Deus entre os homens.

Vendo a sabedoria de suas palavras que demonstravam a sua grande fé na graça de Cristo, Jesus declara a libertação de sua filha com a autoridade que somente Ele possuía para garantir isso. Perceba que Jesus não precisou expulsar o demônio verbalmente, mas, à distância, garantiu a libertação dela.

Cheia de fé, a mulher corre para encontrar com sua filha, não titubeia, e vai para casa. Ao chegar lá, encontra sua filha na cama, liberta do demônio e experimenta o maravilhoso sabor da migalha do poder gracioso de Cristo.
Que exemplo de fé! Que demonstração de humildade! Ela, de fato, creu que aquele pedido feito conforme a vontade de Deus, seria respondido por Jesus. Pergunto-me quantas vezes demonstro esse exemplo de fé e confiança no poder de Jesus. Nós temos um banquete de bênçãos espirituais concedidas a nós e, muitas vezes, pouco caso fazemos delas (Ef 1.3-14).

Quantas vezes clamamos a Cristo pra que vivamos uma vida santa e irrepreensível diante de Deus? (Ef 1.4). Quantos de nós bebemos do perdão de pecados garantido por Cristo a nós, no lugar de escondermos nossas falhas? (Ef 1.7). Temos pedido a Deus por sabedoria e entendimento para compreender a Sua vontade? (Ef 1.8-9). Será que nos ajoelhamos diante de Deus clamando que reavive em nossos corações a esperança da herança que aguardamos? (Ef 1.13-14).

Talvez, você tem experimentado pouquíssimas respostas de Deus porque quando ora, o faz de maneira errada para mergulhar em prazeres egoístas (Tg 4.1-3). Quando nosso foco está na santidade de Deus, no reino dEle e em Sua vontade (Mt 6.9-10), então, experimentaremos o agir poderoso de Deus em nossas vidas.

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